terça-feira, 8 de dezembro de 2015

LIVRO de D.JOSÉ dos SANTOS GARCIA. A GUERRA DOS MACONDES

terça-feira, 8 de dezembro de 2015


LIVRO: A GUERRA DOS MACONDES FORMATADO

D. José dos Santos Garcia
1º Bispo da Sociedade Missionária da Boa Nova
e da Diocese de Porto Amélia
D.José Garcia nasceu na Aldeia do Souto, Covilhã, a 16-04-1913.Foi ordenado presbítero a 27-07-1938. Tendo sido nomeado Bispo de Porto Amélia, hoje Pemba, em Moçambique, foi ordenado Bispo, em , a Nampula a 16-06-1957.
D.José dos Santos Garcia trabalhou, enquanto jovem padre, nos seminários de Portugal . Foi enviado em 1955 , para Moçambique, onde chegou a 31 de Dezembro.
Regressou a Portugal em 1974.
Depois dos 85 anos dedicou-se a reformar a igreja e as capelas da sua terra natal, Aldeia do Souto e a escrever livros: "Alicerce e construção de uma Igreja Africana"; " Diáriodo Mutuáli": "Evangelização de Cabo Delgado"  e " Notas para a História da Paróquia da Aldeia do Souto".
Faleceu em 2010.




 A GUERRA DOS MACONDES

Sinais da luta pela independência de Moçambique

Em 1950, um professor da Ilha e cidade de Moçambique foi passar alguns dias de férias na missão onde eu estava. Um dia em conversa, disse-me que algumas vezes os alunos da escola lhe disseram: Qualque dia vêm os russos com aviões e põem os Portugueses fora de Moçambique.
No mesmo ano, um catequista sério e ao qual eu e a missão ficamos a dever muito disse-me: se houver uma revolta dos pretos, os brancos terão de sofrer muito. Os senhores Padres, Irmãos e Irmãs serão poupados porque os pretos sabem que estão cá para o nosso bem.
Eu nunca tinha dito uma palavra a favor ou contra a estadia ou permanência de Portugal em Moçambique e nas outras colónias.
Como a conversa do professor da Ilha de Moçambique e com a comunicação do catequista fiquei a saber que já estavam a preparar a independência. Depois redobrei o cuidado de nada dizer contra os indígenas ou a favor ou contra a permanência de Portugal em Moçambique e nas outras colónias.
A independência tinha que se dar.

Independência de Moçambique

Quando tomei a responsabilidade de dirigir a missão de Santa Teresinha do Menino Jesus, Mutuali, na Província de Nampula, esta tinha 27 escolas de simples catequese e uma escola de letras, na sede da missão. Transformei as simples escolas de catequese em escolas de letras e catequeses, convencido de que o povo só podia ascender à independência quando muitos soubessem ler e escrever.
Igreja de Mutuali, 
(Província de Nampula.
Ao fundo a serra da Cucuteia
Procurei sempre desenvolver a agricultura e vários ofícios e consegui muito. As escolas de letras e de catequese chegaram a ser 84 e várias pessoas aprenderam os ofícios de carpinteiro, pedreiro, funileiro, sapateiro, alfaiate, serralheiros e todos aprendiam agricultura.
Como bispo missionário, criei logo de início, os seminários menor e depois o maior, a escola de formação de Professores catequistas, vários postos médicos, muitas escolas de letras e catequese ao mesmo tempo. Estas escolas de letras, deram vários alunos para o seminário e deles foram ordenados vários sacerdotes.
Pela prática da vida, convenci-me que uma grande parte da população europeia e algumas autoridades não queriam o desenvolvimento intelectual e material dos indígenas, certamente, para mais facilmente os explorarem. Indico só dois casos sobre o assunto.
Antes de ser nomeado bispo de Porto Amélia, soube que um dia um indígna foi vender gergelim a uma loja que esrava na sede da Circunscrição. Pôs o saco com o gergelim sobre a balança da loja e viu que a balança marcava 30 Kgs. O senhor da loja disse que eram 20 quilos e preparava-se para pagar só 15 quilos. O indígena disse-lhe: Ó patrão, mas a balança marcava 30 quilos. O dono da loja disse-lhe: onde é que aprendeste a ler a balança? Foi na missão, respondeu. O europeu disse-lhe: já te estragaram. Pega no saco e vai vender à missão.
No dia seguinte, tive conhecimento do facto, a 50 quilómetros de distância, na Missão.
O outro exemplo deu-se com a autoridade da Circuncrição e comigo. Quando terminei a construção da grande igreja do Mutuáli e dos dois internatos, devia sair da missão. Fui entregar à sede da Circunscrição uma lista de 40 pedreiros e 35 carpinteiros, que ficavam livres do trabalho na missão. Eles tinham aprendido a ler e a escrever e tinham aprendido o ofício de pedreiro ou carpinteiro na missão. A resposta da autoridade foi:  são outros tantos vadios que me entrega. Como sabiam ler e escrever  e sabiam um ofício, já não os podia mandar contratados para as várias plantações que havia na região.Por isso, eram vadios....
Dos dois exemplos dados, não é difícil tirar a conclusão de que certas pessoas não queriam o desenvolvimento do povo.
No dia da inauguração - 3 de Outubro de 1956 - depois dos europeus terem tomado o almoço oferecido pelos europeus, os alunos presentes comeram tudo o que tinha crescido dos europeus e limparam a sala. Em seguida comuniquei-lhes que já podiam ocupar os grandes internatos e ocuparam-nos e disseram: e fez isto tudo para nós, e fez isto tudo para nós!!! Foi melhoe que a melhor e mais bela pregação que lhes pudesse ter feito.
Como bispo, mandei construir pra os indígenas o Seminário menor, que é um quadrado de 100x100 metro, só com o rés do chão e a largura de 10 metros, a escola para a formação de professores - catequistas, seminário maior com superfício mais ou menos igual, mas com plantas diferentes.
Quando saía algum aluno dos seminários e da escola de professores - catequistas, eu pensava: é mais um que vai trabalhar pela independência de Moçambique.

Carácter do povo Maconde

O povo maconde tem um espírito de independência que não quer sacrificar a outra tribo nem ao europeu. Não quer ceder nada da sua liberdade seja a quem for.
Fui informado que um dia o bispo de Nampula, D. Manuel Guerreiro, antes da criação da Diocese de Porto Amélia, numa visita pastoral, teve uma uma longa conversa com um ancião maconde a quem procurou explicar o que era ser súbito de Portugal e, portanto, ser português. O velho ancião, depois de longa conversa acabou por afirmar: "NANGU MACONDE", eu sou Maconde.
O Maconde nunca se sujeitou e nunca se sujeitará. É capaz e tem desejo de se apropriar dos bons elementos de uma outra civilização, mas com a condição de ele mesmo dizer alguma coisa sobre o método de implantar novos costumes.
Também seria capaz de integrar na Comunidade Poruguesa, se lhe deixassem a liberdade de se integrar como ele queria.

O povo Maconde e a religião.

O povo Maconde era animista. Nunca aceitou o islamismo, nem a poligamia. No culto dos manes, tinha as suas práticas próprias e feitiçarias temidas pelas outras tribos. Mas, quando se lhes apresentou a religião católica, o povo Maconde aceitou-a de boa vontade, mas depois de ter estudado bem a vida dos Padres e das Irmãs, durante 6 anos. Hoje, pode-se dizer que a religião católica está no caminho de ser a religião de todo o povo Maconde.

Os Macondes e o ensino primário

Os Macondes foram menos bem tratados na ocupação. Houve atrocidades.
Ficaram sempre ressentidos e nunca esqueceram os maus tratos porque passaram e ficaram sempre à espera de ocasião própria para se vingarem. Por estes motivos, não queriam frequentar as escolas e aprender o português. Sempre tiveram relutância.
Em 1959, soube que os administradores dos macondes se queixaram ao Governador do Distrito de que as missões só tinham escolas de catequese. Era necessário corrigir esta falta, sem excitar os ânimos.
A Diocese procurou substituir os simples catequistas por professores que tivessem, pelo menos, o diplma da 4ª classe complementar. O facto de os macondes não quererem aprender o português e de alguns missionários concordarem com eles, teve como resultado não se prepararem para a independência. A guerra começou e apoiaram o DRº Eduardo Mondlane, homem culto duma tribo do Sul de Moçambique, sendo eles, como guerrilheiros, a coluna vertebral da FRELIMO.
No fim da guerra dispersaram-se ou foram dispersados de modo que já é muito difícil de organizar-se para outra guerra.
Em 1977 já encontrei alguns em Porto Amélia e umas centenas na Missão de Mieze, a 25 Kms de Porto Amélia.

Companhia Majestática do Niassa

"Em 1894 foi confiada a Administração das terras entre Rovuma e Lúrio à Companhia Majestática do Niassa. Ao tomar posse da administração dos territórios "só alguns pontos do litoral e algumas ilhas adjacentes se achavam efectivamente ocupadas pela autoridade nacional"
Esses pontos do litoral eram QUISSANGA, ARIMBA, MOCÍMBOA e TUNGUE ou PALMA. Nestes pontos (excepto ARIMBA) havia destacamentos militares e postos fiscais. A Companhia teve de fazer a ocupação efectiva de todos os territórios entre o rio Rovuma, o Lago Niassa e o rio Lúrio. Estabeleceu-se em Montepuez em 1899.
Por decreto de 4-11-1899 o Estado entregou à administração da Companhia a vila do IBO.
Em 1902 o governo da Companhia foi transferido para PORTO AMÉLIA.
Terminou a administração da COMPANHIA do NIASSA em 1929
Poucas coisas fizera para o ensino, para a saúde dos indígenas e para a evangelização dos territórios. Chamara os Padres Monfortinos da Niassalândia que em Maio de 1922 se estabaleceram em NAMUNO, e que por ser desejo da Companhia, abriram uma missão nos Macondes em 1924"

Missão dos Macondes 

A COMPANHIA DO NIASSA começou a ocupar o Planalto dos Macondes. Encontrou um povo hostil e pronto a defender-se. O Maconde nunca esqueceu o modo como foi dominado e nunca se sujeitou a nova ocupação. Os Macondes sempre consideraram os Portugueses como os seus maiores inimigos. Compreendendo isso, os Directores da Companhia do Niassa e convencidos de que os missionários poderiam ser de grande utilidade para a Companhia na tarefa de impor o novo domínio, entraram em contacto com os Padres Monfortinos, de língua francesa, que estavam a trabalhar na vizinha Niassalândia. Vieram e instalaram-se em NANGOLOLO no mês de Dezembro de 1924, sendo a Missão criada em 12 de Dezembro de 1924. Os missionários não encontraram um povo desejoso de abraçar a fé católica. Só em 1930 os macondes começaram a converter-se à fé católica, em grupos.
Em 21 de Dezembro de 1940 foi criada a segunda Missão no IMBUHO durante a guerra de 1939 a 1945 hove uma grande afluência de catecúmenos e foram criadas as Missões de NANBUDE.

A actual residência dos missionários em Bomela
Em 9 de Junho de 1946 e a de BOMELA, em 10 de Junho de 1950, seguidas a de CHITOLO,em 25 de Dezembro de 1960 e a de NAMIOCA em 2 de Maio de 1963.

Descontentamento do povo Maconde

A ocupação foi muito dolorosa. Nunca a esquecerão.
Obrigavam-nos a trabalhar de graça nas estradas.
Pagavam-lhes muito pouco nas machambas.
Para pagar o imposto, que eram 60$00, tinham de vender o milho que produziam a $20 e a $30 o quilo. Tinham de o vender nas lojas de comércio que ficavam a 5, 10, 15, 20, 30 e 40 quilómetros de distância onde viviam. Quantos quilos tinham que vender e transportar para fazerem 60$00.
Até 1955 viviam esquecidos  e sem auxílio algum. Eram simplesmente explorados.
Tinham de procurar a água para gastar a várius quilómetros das suas palhotas, de fazerem a rede de distribuição de água.
Por fim, já muito tarde fizeram-lhe a rede da distribuição de água. Mas tinham que a pagar cara.



Em 16 de Junho de 1960, fizeram uma manifestação pacífica, em grande número, para pedirem ao Governador de Distrito, a melhoria de condições de vida, mas foi inútil.


Os acontecimentos de 16 de Junho de 1960

<< O facto mais importante que precedeu a luta armada foram os acontecimentos de MUEDA no dia 16 de Junho de 1960.
Depois de mais de 4 horas de conversação sem qualquer scordo, as autoridades acabaram por dispersar a multidão com recurso às armas, o que se traduziu em verdadeiro massacre, julgando-se que possam ter morrido cerca de meia centena de pessoas. Este facto teve impacto decisivo sobre a população dos macondes, que, empenhados desde então na luta contra as autoridades portuguesas, viiam a constituir a coluna vertebral da Frelimo".

Transcrito de " Guerra Colonial", pág 11, de Aniceto Afonso e Carlos Matos Gomes. 4ª ed. 2005

Esta foi uma manifestação muito pacífica que acabou muito mal. O próprio Governador me informou de que tinha passado a pé pela multidão e em vários sentidos e que notou que as pessoas estavam completamente desarmadas.
As autoridades esperavam resolver tudo pela força e não conseguiram nada.
Depois, tentaram mostrar boa vontade do Governoinstalando no Planalto uma conduta de água para as populações do Planalto dos Macondes, mas foi tarde demais para produzir bom efeito. O preço da água era demasiado elevado para as possibilidades da população.
 *

Política de afastamento 

Desde que começou a luta armada, deviam fazer uma política de atracção, mas faziam uma política de afastamento.
Quando as pessoas fugiam com o medo da tropa ou por qualquer motivo, para voltarem depois de se restabelecer o sossego, quando voltavam, notavam que lhes tinham roubado tudo e incendiado as palhotas. Viam-se sem nada. Afastavam-se cada vez mais.

Abusos numa missão:

Os soldados, durante três dias e três noites,(Presume-se que fossem os militares dos 1º e 2º Grupos de Comandos de Moçambique) tocavam os sinos a qualquer hora do dia ou da noite. Os professores foram presos sem motivo, quando iam para e escola. Os alunos souberam e fugiram para não mais voltarem.
Os soldados estiveram 3 dias e 5 noites nas varandas das casas, deixando tudo sujo em volta das casas.
Vampiros e Sombras. Os 2 Grupos de Comandos de Moçambique
Foi feito um protesto que não teve resposta.
Com semelhantes abusoos, não os atraíam, mas afastavam-se vada vez mais e criavam o ódio para com tudo o que era branco.

A morte do Padre Daniel Boormans

Pelas 20 horas do dia 24 de Agosto de 1964, foi morto o Padre Daniel Boormans, um missionário que estava em NANGOLOLO só há 8 dias.
Foi uma morte absolutamente inesperada e um duro gol+e para os missionários do PLANALTO dos MACONDES. Os missionários tinham recebido algumas cartas, vindas do TANGANICA, informando que alguns missionários seriam tratados como qualquer europeu. Consideraram estas informações como sendo de alguns extremistas e não tomaram qualquer medida de segurança. Depois da morte da morte do Padre Daniel, provou-se, de facto, que o assassinato foi preparado por um grupo relativamente pequeno de extremistas, que andavam impacientes oara entrar em acção de qualquer maneira. A maior parte da população não esteve metida nesta acção e a FRELIMO desaprovou-a por completo, e pôs-se ao lado dos missionários e perseguiu os assassinos.

Túmulo do Padre Daniel Boormans
em Nangololo
A ideia de segurança para os missionários desapareceu e a luta pela libertação entrou, segundo parece, numa outra fase, muito embora a FRELIMO dissesse que a luta armada tinha começado nas acções de 24 e 25 de Setembro seguintes.
Os missionários depois desta morte, deviam ter em conta que,para muitos autóctones, eram todos do lado europeu.
Depois, houve dificuldades para ter padres nas seis missões do planalto, dada a falta de segurança e escassês de pessoal missionário. Não obstante estas dificuldades, em meadas de Setembro dseguinte, todas as missões estavam ocupadas, muito embora as Missões de CHITOLO e de NAMIOCA, ficassem só com uma padre cada uma.

Missão de Chitolo

25 de Agosto de 1964

Pelas 10h30, o senhor Governador  veio comunicar-me que tinha recebido a triste notícia de que o Padre Daniel Boormaans da Missão de CHITOLO, que estava a fazer Retiro na Missão de NANGOLOLO, fora agredido por uma seta na véspera à noite.

O Governador saiu para MUEDA por volta do meio dia. Pedi um ou dois lugares na avioneta para, pessoalmente, ir a NANGOLOLO com o Superior Regional. Foi impossível seguir como desejava.
Na tarde do mesmo dia 25 chegou a seguinte mensagem:

Nº 230/A/27  Padre Superior NANGOLOLO pede  a Bispo e Arcipreste " avisem Família padre Daniel Boormans sua morte ocorrida ontem cerca das 20 horas em "Acidente" caça"

26 de Agosto de 1964

Ao Superior de NANGOLOLO foi enviada a seguinte mensagem, pela rádio, igualmente através do Governo, e expedida para MUIDUMBE às 17h55: "Pedido Diocese rogo a vexa transmitir superior Missão NANGOLOLO. Em união orações e sufrágio apresento todos padres reunidos condolências e peço me represente no enterro. Mande imediatamente um Padre para CHITOLO. Padre Cornélio fica alguns dias em NANGOLOLO".

Pouco antes do meio dia chegou a mensagem que se transcreve, anunciando o enterro (esta mensagem foi enviada directamente pelo Governador através do Governo.

Funeral Padre Daniel hoje dia 26 às 08h00. Renovo meu profundo pesar. Cordeais cumprimentos.

Quando chegou esta mensagem, já se tinha realizado o enterro.
O Governador chegou na tarde deste dia!
Tendo atenção os dois camiões que estavam a transportar - entre 25 e 31 de Agosto - os alunos para
os Seminários e Escola do Magistério, do seu regresso de férias, e como medida de segurança, mandou-se a mensagem aos Administradores de MONTEPUEZ, MUEDA, e MACOMIA para mandarem interceptar os camiões e dizerem ao Irmão, da parte da Diocese, para viajarem só de dia

27 de Agosto de 1964

Como medida de segurança, admitindo a possibilidade de os dois camiões serem atacados com os alunos, mandou-se a mensagem seguinte a NANGOLOLO.

Superior Missão NANGOLOLO

Os camiões que transportam alunos para Seminário e Escola pernoitam hoje em MACOMIA. Resolva e responda se é conveniente ir buscar alunos. O que resolver está bem resolvido. Entregue resposta ao portador. Caso afirmativo camiões seguem de MACOMIA amanhã via DIACA, Para o regresso indique ao Irmão o que lhes parece melhor.

28 de Agosto de 1964

Só em 28 é que o Governo pode contactar com MUIDUMBE para mandar a NANGOLOLO a mensagem sobre o regresso dos alunos
Ás 14h00 chegou a mensagem:

Seminaristas e alunos estão aqui à espera em NANGOLOLO. Os camiões podem vir.

Recebida esta mensagem, comunicou-se imediatamente a MACOMIA para os camiões seguirem, mantendo-se as instruções de só viajarem de dia.

29 de Agosto de 1964

Pelas 11h00 o Intendente comunicou-me que já estavam identificados 7 indivíduos que tomaram parte no grupo do assassinato.
Hoje soubemos que, logo depois das Autoridades de MUEDA terem conhecimento do assassinato do Padre Daniel, mandaram 150 soldados para a Missão de NANGOLOLO (Clika aqui para leres a crónica: GRUPOS, COMPANHIAS E BATALHÃO DE COMANDOS EM MOÇAMBIQUE.)
À chegada dos soldados, a população da Missão fugiu. Só ficaram dois. 
Ao enterro, segundo informações do Tenente Tito Xavier, talvez tivessem assistido 200 pessoas.

                                                                                                              O Conflito armado

Tendo em consideração o temperamento e o carácter do Maconde que nunca esquece os maus tratos  que nunca esquece os maustratos que fizeram às famílias ou à tribo, e tendo presente a maneira como os funcionários da Companhia Majestática do Niassa fizeram a ocupação ou domínio, um dia devia rebentar um conflito armado entre os macondes e o ocupador.
Depois do tempo em que estiveram dominados pela Companhia Majestática do Niassa, os macondes não foram melhor tratados.
Devia ter havido um entendimento entre os chefes dos macondes e os representantes do Governo de modo a combinarem a cooperação e os interesses de maneira aceitável para as duas partes.
Nunca houve este entendimento ou coisa parecida. Quiseram sempre dominá-los pela força. Deixaram sempre em aberto o caminho para um conflito armado e veio a dar-se.
A preparação do conflito armado começou com os milhares de macondes que se refugiaram no TANGANICA, devido aos maus tratos do Ocupador.
Aos Macondes juntaram-se, no TANGANICA, pessoas idóneas de outros partidos e tribos. De entre deles, o Drº EDUARDO MONDLANE, formado em Antropologia. Era LANDIM. Este pôs-se à frente do Movimento de Libertação de Moçambique (FRELIMO). A este Movimento juntaram-se membros de destaque como LÁZARO KAVANDAME, um bom cristão da missão de IMBUHO e Maconde. 

Lázaro Kavandame
O Drº MONDLANE era um homem instruído e como tal, soube montar bem o Movimento. Em pouco tempo, conseguiu atrair os elementos mais importantes e instruídos dos macondes, na maioria cristãos das Missões do Planalto, pois eram os mais instruídos. Foi assim que as Missões do Planalto perderam quase todos professores. Todos entraram na FRELIMO.
O Planalto dos macondes era uma região muito favorável para a FRELIMO. Podia fazer propaganda à vontade.
Em 1963, apareceu o folheto de Propaganda da FRELIMO, que espalhou o seu programa de libertação, denunciando situações e factos capazes de provocar o espírito de revolta, ameaçando os pretos funcionários e cooperadores dos europeus.

A invasão - 23 de Setembro de 1964

A FRELIMO não queria a morte do Padre Daniel Boormans e, por isso, ficou contra os assassinos desta morte insensata e mostrou a sua simpatia pelos missionários, porque sempre ficaram fora da luta e as missões eram mesmo protegidas pela FRELIMO. Porque elas constituíam um abrigo.
Chegou-me a seguinte informação: 
Perante esta atitude da FRELIMO, custa a acreditar que as autoridades não dessem por isso e não tivessem fundadas suspeitas contra as missões. As missões, se queriam continuar o seu trabalho, tinham de ser imparciais, mas isso era~lhes impossível e sabiam que a sua posição era muito delicada e perigosa e que, um dia, devia acabar muito mal.
Os missionários não podiam, nem queriam ajudar, nem apoiar os rebeldes ou o Movimento da FRELIMO, porque estavam todos convencidos que era muito insensato dar, neste momento, a Independência.

Nangololo em 1970
Na realidade, os missionários encontravam-se numa situação muito difícil. Bastaria darem uma informação ao exército e todos ficariam em grande perigo de vida.
No dia 21 de Setembro de 1964, ouviram dizer que a invasão de grupos armados estava iminente e que iam começar a luta armada. Perante isto, mandaram retirar os dois missionários que estavam sozinhos. um na Missão de CHITOLO e outro na missão de NAMIOCA.
No dia 22, os dois missionários retiraram das duas missões do CHITOLO e NAMIOCA,
De facto, os invasores apareceram no dia indicado, no dia 23 de Setembro. Atacaram o Posto Administrativo do CHAI na noite de 24 para 25 de Setembro. A FRELIMO deu este ataque como o princípio da luta armada.
No dia 30 do mesmo mês houve um ataque às lojas, ao quartel e ao campo de aviação. Estes assaltos não tiveram resultado e mostraram a incompetência dos invasores. Marcaram, porém a sua presença, pondo em acção o exército e em grande dificuldades os europeus.

Início da luta armada

Alberto Joaquim Chipande. Comandante dos guerrilheiros
que atacaram o Posto de CHAI
A FRELIMO considera, como início da luta armada, como INÍCIO DA LUTA ARMADA as acções de 24 e 25 de Setembro.
"Contudo, a FRELIMO considera que foram as acções de 24 e 25 de Setembro de 1964 que marcaram o início da luta armada.
Estas acções foram determinadas pelo seu Comité Central, enquanto as anteriores foram atribuídas a grupos de guerrilheiros da MANU e da UNDENAMO.
As acções da FRELIMO em Cabo Delgado, em 24 e 25 de Setembro:
- Colocação de abatises e abertura de pequenas valas nos itenerários de MITEDA - MUIDUMBE - ESTRADA DOS OLIVEIRAS.
- Destruição das pontes de QUINHEVO (junto a MOCÍMBOA DA PRAIA), ESPOSENDE (SAGAL), rio MUEDA, NANGOLOLO e MACHOMA
- Corte da linha telefónica nas imediações das pontes de  QUINHEVO e de ESPOSENDE 
- Ataque ao Posto do CHAI, situado entre MACOMIA e o rio MESSALO.

Alguns factos ou acontecimentos da luta armada

No dia 1 de Outubro de 1964, dois membros da FRELIMO  mataram cobardemente o condutor da carreira de MUEDA a MUIDUMBE. No posta Administrativo do CHAI algumas mulheres e crianças que estavam na varanda foram alvos de um grupo de rebeldes, que felizmente não atingiram ninguém. Os rebeldes foram postos em fuga, por um polícia europeu, abandonando armas e parte  do seufardamento.No dia 9 de Outubro foram atacadas as primeiras lojas de MATIDE e NGOLE. Em NANGOLOLO, foram ameaçados alguns macondes, não simpatizantes com o Movimento de libertação e outros foram mortos pelo mesmo motivo. Vários RÉGULOS, considerados amigos dos europeus, foram liquidados.

Nambude em 1968
Tentaram um assalto a uma coluna de camiões que transportavam máquinas e algodão de ESPOSENDE para Montepuez. Malogrou-se esta tentativa, porque , os condutores não seguiram pela estrada MUEDA - MONTEPUEZ, porque se seguissem por esta estrada teriam encontrado em vários pontos  barricadas de árvores e muitos buracos feitos na estrada..
A 8 Kms da Missão de CHITOLO foram encontradas armas.
Nos fins de Outubro a estrada de MITEDA, passando por NANGOLOLO até MUIDUMBE estava barricadas com árvores e buracos cavados na estrada.
Os ataques mostravam que os rebeldes já estavam espalhados por toda a área e que tinham boas armas. O exército viu-se no meio de um conjunto de guerrilhas, contra as quais a defesa e a ofensiva era impossível. As represálias efectuadas pelo exército caiam principalmente sobre a população com sofrimentos e mortes de inocentes. Disparava-se sobre cada um que tentava fugir. Depois de cada ataque faziam-se razias nas aldeias mais próximas queimando as palhotas e levando presos e a comida que tinham.Não admira que nestas razias se praticassem muitas atocidades e injustiças. Os piores elementos são os voluntários nativos! (CIPAIOS).
Os voluntários fizeram fugir muita gente maconde para o TANGANICA. A rádio anunciou que tinham chegado lá mais de 7.000 pessoas.

Nambude 1968
Os ataques, não obstante continuaram. Nos fins de Outubro, nenhum europeu ficou no mato. As lojas, que ainda não foram incendiadas ou saqueadas, foram fechadas. Só os missionários ficaram no mato desprotegidos.
As escolas foram todas fechadas e os professores macondes, por seremmais de uma vez atacados por membros da FRELIMO foram para casa. No dia 8 de Outubro os professores macondes foram quase todos para o outro lado da fronteira, onde estavam mais seguros.
A afluência extraodinária às missões para comprar panos e outros géneros e para vender castanhas de cajú constitui mais acusações para as missões. Não só a população aproveitou, comprando o que precisava, mas também os rebeldes aproveitavam facilitando, assim, o seu reabastecidemento do que preciSO   

zavam com a política de Portugal

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Encimei esta exposição com a palavra "CONFIDENCIAL" porque a maior parte das acções terroristas não são conhecidas do público, esmo de Moçambique , e não desejo de forma nenhuma que tenham qualquer divulgação por meio da Diocese. As informações dão dadas por mim só para a SANTA SÉ e a NUNCIATURA APOSTÓLICA, em LISBOA, estarem aa par do estado da Diocese.

Estado da Diocese até Agosto de 1964

Podemos considerar a Diocese dividida em duas partes: a parte norte, constituida pelo Palanalto dos Macondes, que fica a norte do rio MASSALO, e aparte sul constituída na sua generalidade por povos MACUAS da raça BANTU.
OS MACONDES e os MACUAS são povos muito diferentes.

A) Religiosamente tudo correu bem até Agosto de 1964. Havia na parte norte, em 1957, quando foi criada a Diocese, as 4 Missões de Santo António de BOMELA, Sagrado Coração de Jesus de NANGOLOLO, Santa Teresinha do IMBUHO e São João de Brito de NAMBUDE. Nesta missões havia, em 1957, 21.150 cristãos.

Residência da Missão de Santo António de BOMELA
Em 1964, na mesma regiãp, há as missões acima citadas e as seguintes Missões e Paróquias, criadas depois de 1957: Paróquia de Nossa Senhora da Assunção de MUEDA, Missão de S.Pedro de MUTAMBA, Missão de S. Teotónio de CHITOLO, Paróquia de MOCÍMBOA DA PRAIA e Missão de S.Miguel Arcanjo de NAMIOCA.
Nas 9 Missões e Paróquias há. presentemente, cerca de 40.000 cristões.
Nestes 7 anos de vida da Diocese houve um grande incremento religioso e material em toda a Diocese, tendo a região do norte - planalto dos macondes - acompanhado esse movimento.

Politicamente tudo correu bem e sem manifestações políticas até Junho de 1960.
Em 16 de Junho de 1960 houve a primeira manifestação. Por força das circunstâncias, morreram algumas dezenas de pretos (macondes).
Desde 16 de Junho de 1960 até Agosto de 1964 não houve mais manifestações, mas parecia haver alguma coisa escondida que ia minando. Nunca mais esqueceram a tragédia de 16-6-1964

Movimentos políticos e terroristas em 1964

Os pretos macondes estavam sedentos de sangue e vingança. Em 24 de Agosto de 1964, mataram o Padre Daniel Boormans, da Congregação de S. Luís de Monfort da Holanda.
Mataram-no sabendo que era Padre, mas não o mataram por ser Padre. Dias antes atacaram um europeu que ia num camião e não conseguiram matá-lo, nem feri-lo; naquele dia mataram o Padre como teriam matado qualquer europeu que aparecesse.
Publicou-se entre a população, que os pretos esperavam um Administrador do Posto para o matar, como não apareceu mataram o Padre com quem tinham falado horas antes e sabiam que passaria naquele lugar, pois tinha lá deixado o carro.
a)
Politicamente, depois de 24/8/64, e, digamos, primeira manifestação terrorista - não houve mais paz. Pelas notícias que, de várias proveniências, me chegaram a ROMA vi que as coisas não estavam bem. Regressado de ROMA, pude verificar que:

Desde 24/8/1964 não houve, de facto, mais paz;
Apareceram várias manifestações políticas no Planalto dos Macondes;
Foram assaltados, com armas modernas, pelos terrorismo, vários carros nas estradas. Não se caminhou mais em paz nas estradas;
Foram assaltadas e roubadas as poucas lojas de comércio que havia espalhadas pelo mato;
Os terroristas - em geral macondes - insistiram, durante muito tempo antes e depois de 24/8/1964, com outros pretos para aderirem à Frelimo. Não conseguindo convencer os pretos a aderirem ao movimento, começaram por ameaçá-los e intimidá-los. Começaram a espancarem a castigá-los à pancada e a feri-los; depois ameaçaram-nos de morte a eles ou a algum membro da família e finalmente começaram a matar os pretos que não aderiram à Frelimo e se mantinham unidos às autoridades portuguesas. Queimavam-lhes as casas.

Homem maconde
6) Os terroristas de um lado e de outro as autoridades do Governo perseguindo-os, criaram um verdadeiro caos na população. Muitas povoações ficaram completamente desertas e foram queimadas. Parte da população, dizem-me, que abandonou o planalto e foi paras as baixas, outra parte, consta que foi para o Tanganica.
Na parte norte da Diocese, segundo informações colhidas junto das autoridades do Governo, não há segurança absolutamente nenhuma. Os europeus que transitarem nas estradas devem ser acompanhados por soldados armados. Os europeus não podem viver isolados e já recolheram todos aos centos urbanos.
Dos pretos que não aderiram à Frelimo, suponha que alguns se vão fixando junto das Administrações para serem defendidos e guardados pelas Autoridades e soldados. Dizem que foram para o Tanganica cerca de 8.000 ou 10.000
8)Aos missionários e Missões não fizeram, até ao presente, além da morte esporádica do Padre Daniel, mal algum.

b) 
Religiosamente, depois da morte do Padre Daniel tudo continuou.

Aparentemente  normal, mas numa grande incerteza;
Os Padres continuaram a visitar - só de dia - as cristandades e as escolas, enquanto existiram;
2) Os Padres Monfortinos prudentemente e por receios fundados encerraram- estando eu em ROMA - as duas Missões de NAMIOCA e de CHITOLO, fundadas nos últimos anos.

A actual Missão de Chitolo
3) As cristandades desorganizaram-se completamente devido à desorganização política das povoações e populações.
4) Alguns catequistas e professores fugiram ou abandonaram o serviço. Outros pediram para para virem trabalhar no sul da Diocese.
As Escolas estão desertas. São poucas as que têm alunos. Praticamente, só existem escolas na sede das Missões.
5) A maior parte dos Seminaristas da região não voltaram aos Seminários, depois das férias. Não vieram seminaristas novos das Missões do Planalto.

 Situação dos Missionários - Padres e Freiras

1) A situação, como é de supor, é delicada e difícil.

2) Não foram atacados pelos terroristas que não atacaram as Missões por vários motivos e também - assim se supõe entre as Autoridades civis e militares - por necessitarem das Missões como pontos de apoio e de abastecimento.
3) Os Missionários não saiem da sede da Missão com confiança. Têm medo dos terroristas que saiem repentidamente do mato e atacam qualquer, sem saberem de que é, com armas modernas.
4) As Autoridades do Governo tinham pedido aos Missionários para denunciarem qualquer movimento subversivo e quaisquer notícias que interessassem à ordem
5) Uma ou duas Irmãs, religiosas da Consolata, e, talvez, um ou outro Padre, foram imprudentes na maneirade falar em relação com a maneira de agir e comprometeram bastante a vida dos Missionários e das Missões.
6) A menos de 200 metros das casas da Missõa de IMBUHO instalou-se um grupo de 100 terroristas que compravam alimentação na Missão e lá eram tratados os seus feridos. Tudo se passava com o conhecimento dos Padres e Irmãs.

As Autoridades do Governo tiveram conhecimento de tudo e no dia 12 de Dezembro de 1964 lá se deu um combate.

Se a posição dos Missionários não era boa, como se disse em 4), agora ficou péssima.

7) As Autoridades tiraram as conclusões:

Os Missionários sabiam, nas várias Missões o que havia de movimentos terroristas e não quiseram dizer; mesmo com os terroristas na Sede da Missão de IMBHUO, e não os denunciaram; os empregados da Missão trabalhavam para os terroristas, um pedreiro servia de cozinheiro para todos; compravam a alimentação na Missão e lá curavam os feridos, e isto tudo - diz-se, com conhecimento dos Padres e Irmãs; dizem que estão afeitos aos terroristas.
8)O que tem valido às Missões e Missionários é a compreensão de um Governador, que está em PORTO AMÉLIA, bom cristão, sensato e prudente que tem dirigido tudo no sentido de defender as Missões e Missionários.

Agora com os factos mencionados em 6) em relação à alínea A) de 7), a defesa transformou-se num beco sem saída.


Sua Exª o Governador acaba de me dizer: ou são evacuados por completo ou teremos de colocar tropa nas Missões para guardar as Missões e os Missionários. Pude verificar, e depois confirmar em conversa com o Governador, que o faz em vista de exclusivamente impedir o abastecimento dos terrorista nas Missões e evitar que estas lhe sirvam de ponto de apoio.

Perante o dilema de evacuar e encerrar as Missões ou ter lá tropa, os Missionários são de opinião que é melhor ficar nas Missões com  tropa. Comuniquei ao Governador que, enquanto não vir agravos foertes às Missões ou Missionários, não concordo com o encerramento das Missões e que opto  - como os Missionários  - pela tropa nas Missões
Ao SuperiorRegional dos Padres Monfortinos comuniquei o que disse ao Governador e disse-lhe para estar com atenção e prudência, no caso de as coisas se agravarem, se encerrar uma ou outra Missão que não ofereça segurança aos Missionários.

Missão de Santa Teresinha do IMBUHO. foto de 26-12-1964
9)A situação dos Missionários é muito delicada e difícil. No dia de Natal (1964) enviei a todos uma pequena saudação, exortando-os à oração, confiança em Deus e recomendando-lhes, como já tinha feito várias vezes, muita prudência

Porto Amélia, 31 de Dezembro de 1964






                      Situação das Missões no fim de 1964

Cada Missão tinha as suas dificuldades


A Missão de S. SANTO ANTÓNIO de BOMELA


Foi criada em 10 de Junho de 1950.

Esta Missão não tinha alunos desde as férias de Agosto de 1964. Desde o princípio de Novembro, as visiitas à povoações eram impossíveis.
Perto da Missão, a uns dois Kms foi morto cobardemente um cristão desta missão, chamado CASTIM. Não se conseguiu descobrir a razão porque foi assassinado mas provou-se, mais uma vez, que os pretos aproveitaram o Movimento de Libertação para liquidar pessoas, que desde há muito, eram seus inimigos pessoais.
O apostolado desta Missão parou por completo. Quase toda a gente das imediações tinha fugido para o Tanganica. Alguns esconderam-se nas matas. Era inutil estar nesta Missão. Sabia-se que a vida do Padre HENRIQUE VAN BERGEN, superior da Missão estava ameaçada.

A actual residência dos Padres da Missão de Bomela
MISSÃO de JOÃO de BRITO de NAMBUDE

Esta Missão foi criada em 9 de Junho de 1946.

Em Outubro de 1964, os professores catequistas fugiram da Missão e as escolas deixaram de funcionar.
As relações entre a Administração e a Missão não eram boas.
Pelo contrário! O Administrador suspeitava que ospadres davam colaboração efectiva aos rebeldes, pois ele sabia que havia muitos elementos revolucionários entre a gente de NAMBUDE e que a Missão nunca tinha denunciado coisa alguma.
Na véspera do Ano Novo, aproximou-se de NAMBUDE um grande grupo de tropa, que entrou na Missão no dia 1 de Janeiro, antes da Missa. Estavam convencidos que os Padres colaboravam com os rebeldes. O que faltava era uma prova. E para isto foi tudo revistado, edifícios, e tudo o que se encontrava dentro. Não encontraram nada. Desta vez a tropa não fez investigações nem na residência dos padres, nem das Irmãs. Fizeram isso noutra razia, no dia 21 de Janeiro. Tudo foi sujeito a minuciosas investigações. Desta vez, também as residências dos padres e irmãs foram revistas. Também desta feita não encontraram o que com tanta satisfação procuravam e queriam encontrar.

Missão de S. João de Brito em Nambude. Foto de 26-12-64
Na razia de 1 de Janeiro e de 21 de Janeiro foram feitas muitas prisões, entre as quais, todos os professores - catequistas da escola da missão, alguns alunos, e até doentes e mulheres foram maltratados. a tropa foi acompanhada por um rapaz, chamado AMIR, muçulmano, que um dia, depois de ser assassinado o seu pai pela FRELIMO, jurara que cabaria com a missão.
Em 21 de Janeiro, todos os alunos fugiram da missão. Um dia mais tarde, os moleques foram também, por não se sentirem seguros.
A Missão de NAMBUDE ficou vazia, sem cristãos, sem gente, sem professores - catequistas, sem alunos e até sem criados. A situação tornou-se impossível. Os da FRELIMO que se tinham abrigado não muio longe da Missão. Nesta situação os Padres deviam servir a dois Senhores que estavam a combater-se até à morte. A única coisa que deviam fazer para salvar a vida era retirar-se.

A Missão do SAGRADO CORAÇÃO de JESUS de NANGOLOLO.

Anexo da Missão do Sagrado Coração de Jesus em Nangololo
Foto de 27-7-1965


Em Dezembro de 1964, o Padre Guilherme Kuipers, superior da Missão, comprou vários panos e outras mercadorias para vender ao povo que já não tinha outro lugar para comprar as coisa necessárias à vida. A Administração julgou qque todas essas compras foram feitas para reabastecer os rebeldes. De qualqer maneira se portassem, os missionário eram cada vez mais mal vistos. As autoridades não pensaram que era obrigação grave da Missão socorrer tantas mulheres, crianças e velhos que viviam na maior miséria, não tendo nada para vestir nem para comer.
Em comparação com outras Missões, esta Missão estava em condições favoráveis. Os Missionários ainda podiam visitar cristandades. Assistência à Missa Dominical era bastante razoável.

A Missão de SANTA TERESINHA do IMBUHO
***********************************************

Esta Missão foi criada em 21 de Dezembro de 1940.
Em dezembro de 1964, descobriu-se em frente da Missão, um grupo de rebeldes.  Os Padres, que tinham conhecimento disto, não denunciaram nada à Autoridade competente. O local onde estavam escondidos os rebeldes foi atacado e bombardeado no dia 12 de Dezembro de 1964. A Missão comprometeu-se muito perante as Autoridades. Os Padres não podiam denunciar nada, porque estariam em perigo iminente de vida,logo que os rebeldes tivessem conhecimento disso. A Missão esteve numa situação muito crítica. Aberta, mas falsamente, o Padre ALBERTO DEFESCHE foi acusado de ter colaborado com os rebeldes tratando-os, quando estavam feridos ou assistindo-os quando foram tratados.
Desde então a Missão foi ocupada militarmente.
Tendo presente tudo o que se passou nas várias Missões, não era para admirar, que diversas manifestações de descontentamento de elementos da população civil, dos elementos Administrativos e militares chegassem ao Bispo da Diocese de Porto Amélia, em relação aos Missionários, que trabalham no Norte do Distrito. Acusaram os missionários de cooperarem com os rebeldes contra a soberania portuguesa, alegando como prova, a simpatia que a população nativa tinha revelado para com as Missões e o seu pessoal. Isto obrigou o Bispo da Diocese a defender os Missionários junto ao Governador Geral, que representava todas as Autoridades de Moçambique e a sua população.


Têm chegado ao meu conhecimento diversas manifestações de descontentamento da população civil, de elementos militares e administrativos em relação aos missionários que trabalham no norte do Distrito. Estas manifestações, fundamentalmente, concretizam e traduzem falta de confiança e reserva em relação a esses missionários, que são julgados mancomunadose solidários com graves desordens havidas, de rebelião contra a soberania portuguesa e as legítimas autoridades. Alega-se, como prova dessa solidariedade, a simpatia que a população nativa tem revelado com as missões e o seu pessoal.

Ora esta sitauação tão complexa deve, a nosso ver, ser aclarada com a segurança de factos que um passado aina não longínquo nos apresenta.
Já no tempo da ocupação, a situação, nessas áreas, foi muito melindrosa, conservando-se, embora, ocultamenre, como uma chaga que nunca cicatrizou por completo, para o que contribuíram, não pouco, erros que depois se seguiram. Os acontecimentos de 16 de Junho de 1960 assumiram, aos olhos da população, um carácter sangrento que não deixou de os excitar em nosso desfavor, para uma represália em futuro oportuno.
Esta situação não foi provocada pelos missionários; não a provocaram nem a mantiveram; dar-se-ia mesmo se eles lá não estivesse.



Nangololo. Foto de 5-1-1965
A simpatia dos autóctones para com eles pode considerar-se como resultante de muitos factos, que facilmente a explicam: a sua longa permanência que eles viram sempre como um auxíkio, em seu benefício, numa dedicação de todas as horas sem nenhuma retribuição. Não os maltrataram, não abusaram da sua inxperiência, roubando-os  ou explorando-os nos trabalhos e vendas dos produtos; respeitavam-lhes as suas mulheres e filhas e aquilo que lgitimamente lhes pertencia.
Não é difícil ver nestas atitudes dos missionários, a causa de uma simpatia que lhe foi radicando bem funda até hoje.
Aos olhos dos autóctones, os padres apareceram sempre como pessoas desinteressadas, que sem auxílio e, por vezes, sem compreensão de ninguém, desde a primeira hora, os ajudaram material e moralmente.
Para os missionários, por outro lado, os nativos eram sempre o objecto da sua dedicação, dos seus sacrifícios, transformados depois da sua conversão à fé cristã, em ovelhas do seu rebanho.
Tenho por bem apresentar estas considerações a Vossa Excelência por as julgar úteis para a interpretação de certos factos, relacionados com as actividade dos missinários do Norte do Distrito.
Apresento o ensejo para apresentar a Vossa Excelência os meus respeitosos cumprimentos




                                                                        X




1) Missão de S.João de Brito de Nambude

Junto à Missão de S.João de Brito de Nambude instalou-se um grupo de terroristas. As Autoridades tiveram conhecimento dele, vindo a verificar que os Missionários já anteriormente sabiam da sua prença ali. Em 1, 2 e 3 de Janeiro de 1965, as tropas acamparam na Missão, tendo o seu comportamento sido menos  digno. O superior da Missão escreveu ao Comandante Regional apresentando as suas queixas, tendo-me enviado cópia da carta. Devido a isso, enviei um protesto ao General Comandante.


2) Missão de Santa Teresinha de Imbuho

Na Missão de Santa Teresinha, apareceu há poucos dias, talvez em 13 de Janeiro, um outro grupo de terroristas, a cerca de 500 metros da missão.
A indisposição das autoridades, dos militares e civis contra os missionários não tem melhorado.

3) Defesa dos Missionários

Em defesa dos missionários, escrevi o ofício nº 57/b/1 dirigido ao Exmo Governador Geral, de que junto aqui uma cópia.

Nada mais pude dizer, pois o facto de as autoridades encontrarem armamento terrorista junto da Missão e de os terroristas se abastecerem de alimento e vestuário na Missão, como as autoridades me provam, tiram-me toda a possibilidade de mais defesa.
As autoridades governamentais queixam-se de que os missionários só são imparciais como o Governo, porque conheciam os pormenores do movimento terrorista e não avisaram as autoridades civis e militares, que estão convencidas de defenderem uma causa justa, e são parciais com os terroristas cedendo-lhes alimentos, vestuário e tratando-lhes os doentes, não os denunciando, como acima disse. O facto de estarem a transitar ilesos entre as populações onde estão os terroristas torna-os só por si, suspeitos às autoridades e aos civis. Foi neste sentido que escrevi o ofício de defesa a que já me referi.

4) Permanência dos Missionários na Diocese

Têm-me chegado boatos de que os missionários quereriam retirar da Diocese para a Holanda ( são Monfortinos holandeses). Tenho feito e continuarei a fazer todo o possível para evitar que esta retirada se dê. Quando, segundo as informações deles e do seu superior, não puderem continuar nas missões do Norteonde estão ou for aconselhável eles evacuarem essas missões, virão para Sul da Diocese, onde a sua Congregação tem seis missões e paróquias. De forma alguma se podem deixar sair da Diocese. Peço a Vossa Excelência Reverendíssima se digne fazer o possível para que se evite a sua saída para a Holanda, caso eles a proponham.







Os missionários das Missões dos Macondes

Os missionários das Missões dos Macondes eram monfortinos holandeses.
Os missionários vão para qualquer parte do mundo, onde sejam necessários, não para fazer política, mas para evangelizar. A evangelização é o seu trabalho específico.
PIO XI disse: evangelizando-se, civiliza-se, mas não se evangeliza, civilizando.
Desejar que os missionários holandeses, depois de a Holanda ter dado a independência à Indonésia, defendesse a política de Portugal a respeito de Moçambique, era desejar uma coisa impossível.
Pelo ESTATUTO MISSIONÁRIO (decreto nº 31.207, de 5 de Abril de 1941), Portugal deu ao missionários Portugueses e estrangeiros que trabalham nas suas colónias ou províncias, as facilidades e benefícios que dava aos funcionários do Estado, porque não eram, nem podia sê-lo.
Segui sempre este princípio e exigi sempre o respeito por Portugal.
Um dia estava comigo, no paço de Porto Amélia, o Provincial da Holanda dos Missionários Monfortinos. Estavam também connosco o Superior Regional que cessava as funções e o Padre que as assumia. O Provincial pediu-me para dizer umas coisas a um padre que se manifestava contra Portugal. Respondi-lhe: posso dizer-lhe o que deseja mas é inutil, porque há meses me escreveu uma carta longa com menos respeito por Portugal. Não respondi à carta. O Superior Regional cessante disse imediatamente: EU NÃO ESTAVA QUANDO ELE ESCREVEU A CARTA MAS QUANDO VI A CÓPIA DISSE-LHE: ESTA CARTA NÃO SE ESCREVIA.Eu disse-lhe: estão aqui os dois Superiores, o que cessa as funções e o que as assume, eles digam se algum dia me ouviram ou viram escrita algumas palavras a favor ou contra Portugal. Os dois disseram ao mesmo tempo: nunca ouvimos nem vimos uma palavra sua a favor ou contra Portugal. Perante isto, o Provincial disse: vou falar com o Padre.
Na guerra que começou na Diocese de Porto Amélia e onde se manteve sempre forte, e se estendeu ao NIASSA e TETE, qualquer posição que tomassem os missionários era sempre muito delicada e comprometedora para com eles. Não podiam manifestar-se ao lado dos Macondes que muito estimavam, porque com eles trabalhavam desde 1924. Se o fizessem eram atacados gravemente pelas Autoridades do Estado e pelo exército português.
Se optassem manifestar-se pelos brancos ou pelos portugueses seriam atacados pelos macondes que tinham as missões como suas mães. Se optassem pela imparcialidade, parece que deviam conservar-se imparciais, mas não podiam, porque seriam atacados e correriam grande perigo de vida dos dois lados (dos macondes e dos portugueses).
Como terei ocasião de o dizer, estava muito bem informado da vida de cada missão e dos perigos que corriam os missionários. Quando me convenci de que era impossível continuar a vida das missões, devido ao perigo muito iminente em que se encontravam os missionários, sugeri ao Superior Regional que avisasse ou informasse o Provincial da Holanda e Superior Geral, que estava em Roma, onde residia. O Superior Geral mandou que o Superior Regional e outro padre fossem a Roma e foram. O Conselho Geral do Instituto foi do parecer que os missionários e as religiosas saíssem das Missões.
O Superior Geral foi a Porto Amélia, falou com o Bispo e assinaram o documento que permitiu oENCERRAMENTO DAS MISSÕES, EM 25 DE MARÇO DE 1965
Evacuação das Missões do Planalto dos Macondes
De dia para dia as realações ads Autoridades e  da FRELIMO com as Missões eram cada vez piores e irreconciliáveis. As Autoridades do Governo contavam com a cooperação dos Missionários. Por sua vez, a FRELIMO contava com a ajuda dos Missionários em oposição ao governo. Era abslolutamente impossível servir as duas partes antagónicas. Também se tornou impossível a imparcialidade, porque ambas as partes queriam à força a cooperação dos Missionários. Os Missionários da Missão de NANGOLOLO e os Padres da Missão do IMBUHO não se podiam deslocar a BOMELA, local onde se poderiam abastecer das coisas mais necessárias para a vida. Só poderiam ir à Missão de BOMELA com autorização da FRELIMO e não lhes convinha pedi-la. Por ocasião da visita do Padre Geral, os Missionários souberam que no dia 17 de Março de 1965 haveria vários ataques da FRELIMO. 

A actual residência dos Padres em Bomela
O Padre tinha recebido um telegrama, levado pelos soldados, a dizer que tinha de ir, sem demora, à Missão de BOMELA. Teve de ficar na cama, dissimulando que estava doente para não se tornar suspeito dos Militares. O Padre BRUININKS e o Irmão AMANDUS só poderiam ir a BOMELA um dia mais tarde.
Disseram aos Rev. dos Padres do IMBUHO que um contingente maior da tropa ia estacionar na Missão, e que o Comandante desejava um quarto na residência dos Padres.
Em BOMELA, o Padre Henrique van Bergen recebeu uma carta dum Professor em serviço, que era ao mesmo tempo secretário da FRELIMO. O envelope tinha o carimbo do Movimento de Libertação. O que teria acontecido, se esta carta tivesse caído nas mãos da tropa?
Não obstante a ocupação militar na missão de NANGOLOLO, um "militar" da FRELIMO, entrou no quarto de um Padre com a arma (stegun) escondida, por baixo da sua camisa.
As exigências que FRELIMO que até agora fez às Missões, foram moderadas. Mas o que esperam das Missões, se um dia se encontrarem em grandes dificuldades e necessidades?
E como será a sua reação se então não receberem a ajuda que esperam das Missões?
No mês de Março de 1965, os ataques efectuados pelos rebeldes revelam uma direcção inteligente e apresentam um armamento bom e eficaz. Talvez por Março ser o mês das chuvas, por ser este o tempo mais favorável para eles exercerem a sua actividade subversiva, os ataques são mais violentos e sucedem-se uns aos outros. As estradas estão péssimas, são quase intransitáveis, estão cheios de buracos com água, o capim está muito alto e não permite ver nada ao lado das estradas, não há possibilidade de transportes. Em caso de emergência, não há meios para socorrer as Missões, que ficam completamente isoladas e não se podem abastecer das coisas mais necessárias à vida.
A situação é tão grave, que é ABSOLUTAMENTE NECESSÁRIO EVACUAR AS MISSÕES.

Nangololo. Foto de 5de Janeiro de 1965
Em 10 de Março de 1965, chegou a PORTO AMÉLIA o Superior Geral dos Monfortinos. No dia 14, o Superior Geral, acompanhado pelo Superior Regional Substituto falou com o Governador do Distrito. No dia 15 falaram com o Bispo da Diocese, que os aconselhou, uma vez que estava em PORTO AMÉLIA, que por delicadeza para com os Missionários, visitasse as Missões que pudesse, falasse com os Missionários e depois encerrar-se-iam as Missões. No dia 16, o Superior Geral, acompanhado pelo Superior Regional foram para a Missão de BOMELA falaram com os Padres. Regressando a PORTO AMÉLIA, visitou a Missão de MONTEPUEZ. No dia 21 de Março, Domingo, os Missionários da Missão de NANGOLO tiveram mais de 1.000 pessoas à Missa.
No dia 25 de Março de 1965 foi assinado pelo Bispo e pelo Superior Geral o documento do encerramento ou evacuação das Missões.



Tradução


                       Evacuação das Missões dos Macondes

Sua Exª o Bispo de Porto Amélia e o Superior Geral dos padres Monfortinos, depois de profunda reflexão, decidiram evacuar temporáriamente os postos das Missões de NANGOLO, BOMELA, IMBUHO, NAMBUDE, CHITOLO e NAMUIOCA. A situação no território a Norte da Diocese é muito perigosa e o Bispo e o Superior Geral não se podem responsabilizar de deixar os padres, irmãos e irmãs nos seus postos. A evacuação é temporária e assim que aordem for restabelicida os padres e os irmãos voltarão imediatamente a retomar o seu trabalho de missionários.

Porto Amélia, 25 de Março de 1965


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