segunda-feira, 13 de novembro de 2017

AS PRIMEIRAS COMPANHIAS EM NOVA COIMBRA - LUNHO E MIANDICA DE 1964 1966

 NOVA COIMBRA- LUNHO- MIANDICA

TERRAS MÍTICAS  NA GUERRA DO ULTRAMAR EM MOÇAMBIQUE NO DISTRITO DO NIASSA
A DISTANCIA ENTRE ELAS ERA DE SENSIVELMENTE DE 40 KMS.
FOI LÁ QUE MORRERAM EM COMBATE VÁRIAS DEZENAS DE JOVENS SOLDADOS PORTUGUESES. 
FOI LÁ QUE O CAP. CAÇORINO DIAS DA CCAV. 754 FICOU  CEGO
FOI LÁ QUE O CAP. DUARTE PAMPLONA DA CCAV. 1505 FICOU AMPUTADO DAS DUAS PERNAS.
FOI LÁ QUE O CAP. HORÁCIO VALENTE DA 4ª CCMDS MORREU EM COMBATE.
FOI LÁ QUE O TEN. CARVALHO ARAÚJO DA CCS do BCAÇ 598 MORREU EM COMBATE

Companhia Cavalaria 568 do Batalhão de Cavalaria 571



Comandada pelo Capitão de Cavalaria José Miguel de Cabedo e Vasconcelos, desembarcou na Beira, a 27 de Outubro de 1963, sendo retirada temporariamente ao BCAV 571.
Em Janeiro de 1965, aquartelou em Congerenge, sob o comando do BCAÇ 598.
Em Agosto de 1965, transferida para Nova Coimbra, manteve a subordinação operacional àquele batalhão, que em Setembro de 1965, deslocado de Vila Cabral para Metangula assumira a responsabilidade de novo subsector (criado à custa da divisão do subsector de Vila Cabral). Destacou um pelotão para Mandimba. Efectuou patrulhamentos e nomadizações nas regiões de Messumba, Massange, Mechequene, Tandamula e Liponda. Participou em várias operações, designadamente: "Tilapa" nas margens do rio Mepotxe e "Campango", na região de Ambuzi-- N`Dalala.
Em Novembro de 1965, regressou ao Ile-Errêgo na Zambézia.

A 22 de Outubro de 1965, morreu em combate na Missão Católica de Nova Coimbra  Humberto Galvão Bacelar 1º Cabo Cripto da CCAV. 568



Comandada pelo Capitão de Cavalaria José Miguel de Cabedo e Vasconcelos, desembarcou na Beira, a 27 de Outubro de 1963, sendo retirada temporariamente ao BCAV 571.
Em Janeiro de 1965, aquartelou em Congerenge, sob o comando do BCAÇ 598.
Em Agosto de 1965, transferida para Nova Coimbra, manteve a subordinação operacional àquele batalhão, que em Setembro de 1965, deslocado de Vila Cabral para Metangula assumira a responsabilidade de novo subsector (criado à custa da divisão do subsector de Vila Cabral). Destacou um pelotão para Mandimba. Efectuou patrulhamentos e nomadizações nas regiões de Messumba, Massange, Mechequene, Tandamula e Liponda. Participou em várias operações, designadamente: "Tilapa" nas margens do rio Mepotxe e "Campango", na região de Ambuzi-- N`Dalala.
Em Novembro de 1965, regressou ao Ile-Errêgo na Zambézia.

CCS do Batalhão de Caçadores 598

Por: Eduardo Nunes





Comandada pelo Tenente Coronel de Infantaria, Joaquim Correia Ventura Lopes, embarcou com destino a Moçambique a 10 de Outubro de 1963.
Em Novembro de de 1963 a ZA do Batalhão compreendia todo o Distrito do Niassa, dependendo operacionalmente dele, além da CCS, 5 companhias operacionais que estendiam a sua acção através das Administrações de MECULA, MARRUPA, MAÚA, NOVA FREIXO, MANDIMBA, MECANHELAS, VILA CABRAL, MACALOGE, VALADIM, MANIAMBA, METANGULA, CÓBUÉ, e OLIVENÇA.
Nos primeiros meses da nossa estadia naquele Distrito efectuaram-se vários reconhecimentos e patrulhamentos, para o conhecimento do terreno da sua ZA, e contactar os núcleos populacionais existentes.
O ambiente nesta ZA, foi-se tornando cada vez menos favorável até que em 26 de Setembro de 1964 se registou o primeiro ataque, por elementos armados, em CÓBUÉ sobre a lancha da Marinha ali ancorada.
Face a este acontecimento, e outros rumores que se ouviam. Resolveu o Comandante do Batalhão, pôr em prática um conjunto de medidas, que pudessem enfrentar o inimigo em futuros ataques às nossas tropas estacionadas na ZA.

Algures entre Nova Coimbra e Maniamba.
Posto de abastecimento auto.
Tendo para o efeito reunido todo o pessoal operacional, e determinado a sua deslocação de VILA CABRAL para o CÓBUÉ, onde tiveram início manobras militares, afim de vasculharem todo o terreno, passando por MIANDICA, LUNHO, NOVA COIMBRA, toda a zona compreendida entre METANGULA, MANIAMBA, MEPONDA até ao ponto de partida VILA CABRAL.
A 23 de Novembro de 1964, em pleno exercício, aconteceu o que ninguém esperava.Na ZA triangular entre NOVA COIMBRA- METANGULA- MANIAMBA ocorreu um brutal acidente de viação com o capotamento de um Unimog, causando a morte imediata a um militar, conforme imagem em baixo.

Picada Nova Coimbra- Metangula
Mais um acidente, mais um morto

Este foi um dos negros dias do BCAÇ 598, durante a sua comissão de serviço em Moçambique de 1963 a 1966.

Acampamento no LUNHO

Ano de 1965, em Janeiro. De VILA CABRAL se deslocou, o Pelotão de Sapadores, foi o primeiro, que no rio LUNHO acampou. Junto da velha ponte que já existia, com tendas de campanha, seu quartel montou. Durante três meses muito choveu. Foi o tempo que lá ficou. Camas não haviam, para se dormir. Do capim se fez colchão. Dores no corpo fazia sentir, da dureza daquele chão. Para a ponte continuar a reconstruir, era essa a nossa missão. Sem ferramentas , e o tempo não o permitir. Para o não fazer tinha-mos razão.
A "velha" ponte do rio LUNHO
Também um forno se construiu , para coser o pão. Era eu o padeiro, encarregado dessa missão. Todos os dias se cosia, não faltava na hora das refeições. Durante três meses foi assim. A ponte como a encontrámos, quando fomos embora, na mesma a deixámos. Pelo inimigo éramos observados , tínhamos pouca segurança. Estávamos a ser cercados. Sem saber qual o dia da mudança. Esse dia chegou, para VILA CABRAL se marchou com o LUNHO na lembrança
31 de Maio de 1965. Na tarde triste daquele dia sangrento.O pessoal operacional, do BCAÇ 598,do qual eu fazia parte, encontrava-se estacionado em NOVA COIMBRA. Foi-nos solicitado para socorrer um pelotão da CCAV 754 (SETE DE ESPADAS), que acompanhava o Comandante do referido Batalhão, durante uma visita que efectuava à CCART 637 que estava acampada em Miandica


Hora do Rancho em Miandica
No regresso, e já próximo do Rio LUNHO, sofreram uma emboscada por elementos armados da FRELIMO. Em NOVA COIMBRA, foi recebido o pedido de socorro e de imediato partiu daqui o pessoal para o local do trágico ataque. Um Unimog, quando se preparava para arrancar, num momento de silêncio um tiro se ouviu. Olhei e vi, um camarada meu de nome Vasconcelos, que momentos antes, tinha subido para o Unimog, tendo ficado de pé encostado ao separador que divide a cabine da carroçaria, com o cano da arma na posição vertical encostado à cintura, cair para o chão. A sangrar de um ferimento causado por uma bala disparada pela sua própria arma.
Socorrido de imediato para a Base da Marinha em METANGULA, onde chegou sem vida. 
Eu e o restante pessoal seguimos para o local da emboscada, onde encontrámos seis mortos, cujos corpos estavam desfeitos em pedaços por todo o lado, Horror, todos pertenciam à martirizada  CCAV 754.
A referida companhia já estava nessa data acampada em NOVA COIMBRA, onde continuou até Fevereiro de 1966, data em que a CCS do BCAÇ 598 foi rendido em METANGULA.

A 31 de Maio de 1965, morreu em combate um militar da CCS do BCAÇ 598
A ....... de Junho de 1965 morreu em combate o Tenente Carvalho Araújo da CCS do BCAÇ 598 


COMPANHIA DE CAÇADORES 612 



Comandada pelo Capitão de Infantaria Luís Augusto Tavares Soares da Cunha, desembarcou em 21 de Janeiro de 1964. Colocada em Vila Cabral, sob o comando operacional do BCAÇ 598,ali sedeado. De Julho de 1964 a Fevereiro de 1965, guarneceu Mandimba com uma secção. A actividade operacional da companhia, consistia em treino operacional e contacto com a população em acção educativa e medicamentosa.
Ocorrendo em 26 de Setembro de 1964, a primeira acção da FRELIMO, na região do Lago Niassa, com o ataque aos postos administrativos de Metangula e Cóbué, passou a efectuar patrulhamentos naquelas zonas. Em dezembro de 1964, destacou uma secção para Olivença, onde decorrido pouco tempo, devidoao agravamento da situação, passou para efectivo pelotão; substituído em finais de Outubro de 1965 pela CCAÇ 73. Reforçada com um pelotão de Fuzileiros, intensificou a actividade operacional nas zonas de Cóbué, Chitege, N`Gombe, Lipotxe e Olivença, resultando a destruição de três acampamentos em Chitege e Mapunda e a recuperação de cerca de 200 pessoas que se encontravam refugiadas nas matas. Tomou parte na operação "Jacaré Filho" na região de Chigoma junto ao Lago Niassa.
A partir de Setembro de 1965, ficou sob o comando do BCaç EV 7, que rendeu o BCAÇ 598, transferido para Metangula, onde assumiu a responsabilidade de novo subsector, criado na região do Lago Niassa.

COMPANHIA DE ARTILHARIA 637 

 Por: Faria Barbosa
  2º Sargento da CART 637
                        

A CART 637 do BART 639, comandada pelo Capitão de Artilharia Luis António Themudo Gagliardini, embarcou em Lisboa no navio "Niassa"em 1 de Abril de 1964, onde desfilou conjuntamente com as restantes unidades do Batalhão.
De imediato seguiu para NACALA onde desembarcou a 26 de Abril de 1964, seguindo por via terrestre para MAÚA, onde ficou aquartelada nas instalações de uma antiga fábrica de descasque de algodão.


Desfile em Lourenço Marques
Foi-lhe atribuída uma zona de acção que compreendia as áreas dos Postos Administrativos de MAÚA, REVIA, MUNGO e NIPEPE, por onde realizou várias operações de reconhecimento, e nomadização, acção psicológica e exercícios de preparação e treino operacional.
Em 12 de Janeiro de 1965 destaca 2 Grupos de Combate para reforçar a CCS do BCAÇ 598 instalada em VILA CABRAL. Estes Grupos de Combate exerceram actividade operacional nas zonas de MANIAMBA, CÓBUÉ, OLIVENÇA, MATACA e LIPOTXE.
Regressaram a MAÚA em 31 de Janeiro.
A 16 de Fevereiro de 1965 a CART 637 vai, na sua máxima força reforçar a CCS do BCAÇ 598na região de MANDIMBA, onde se previam acções de Grupos IN vindos do MALAWI.
Regressa a 1 de Março 1965.
Em 19 de Fevereiro de 1965 a CART 637 destaca para VILA CABRAL, em reforço da CCS do BCAÇ 598, e vai de imediato nomadizar na zona de NOVA COIMBRA, MIANDICA, montando um acampamento (base) em MESSUMBA a partir do qual fez vária operações.


Acampamento em Messumba
Em 29 de Maio 1965 a CART 637 monta nvo acampamento (base) entre MONHEERE e MIANDICA, a partir do qual realiza diversas operações nas zonas de ABILO. LIGANGO, MIANDICA e POMBAMALL.
Em 14 de Junho 1965, quando um Grupo de Combate se desloca do acampamento para MIANDICA, foi accionada uma mina, seguida de emboscada, onde morreu o soldado JOSÉ de ARAÚJO SENDÃO. Foi a primeira mina detectada em território de Moçambique e o primeiro militar da CART 637 caído em combate. No mesmo local, a poucos metros, foi localizada um segunda mina que foi levantada com êxito pelo 2º Sargento Faria Barbosa. Foi também a primeira mina levantada em Moçambique.


A primeira mina levantada em Moçambique
Esta mina foi inactividade, analisada e estudado o seu diagnóstico de funcionamento pelo 2º Sargento Faria Barbosa o qual elaborou um relatório que foi enviado ao ESCALÃO superior e por este divulgado às restantes unidades em operações.
A CART 637 manteve-se acampada neste acampamento de ABILO até Julho de 1965, tendo realizado várias operações com e sem contacto com o inimigo.
Nesta data a CART 637 desactiva o acampamento (base), monta algumas armadilhas no local e inicia a viagem de regresso a VILA CABRAL, beneficiando do apoio aéreo a partir do rio LUNHO. Chegou a VILA CABRAL a 17.
Manteve-se em VILA CABRAL até 6 de Agosto de 1965, fazendo escoltas a diversas colunas de reabastecimento, lanchas de "fusos" e outras operações em colaboração com as autoridades administrativas.
Missa campal no Lunho
A partir de 6 de Agosto instala-se em MANIAMBA (junto ao Posto Administrativo) onde lhe é atribuída uma ZA compreendida entre o LAGO NIASSA e o rio MESSINGUE e desde o cruzamento METANGULA-NOVA COIMBRA até ao KM 40 da picada  VILA CABRAL- MANIAMBA.
Daqui parte para diversas operações, tendo uma delas, na região de COLOMA, sofrido uma emboscada, com forte poder de fogo do inimigo de que resultaram 2 mortos-Furriel ANTÓNIO MARQUES CARNEIRO e o soldado AMÍLCAR GONÇALVES da COSTA RAMOS (o ALGARVE). O IN teve 11 mortes confirmados e, segundo notícias posteriores, cerca de 15 feridos.
A CART 637 manteve-se em MANIAMBA até 13 de Novembro de 1965 realizando operações de combate, escoltas e outras, nas zonas de MEPONDA, COLOMA, RIO MESSINGUE, PAGAGE e na célebre zona do caracol na picada MANIAMBA-METANGULA.
Em 13 de Novembro de 1965 a CART 637 regressa a MAÚA terminando assim a sua actuação na zona de VILA CABRAL. Entretanto as actividades do IN na zona de MAÚA haviam-se intensificados e a CART 637 foi chamada a executar várias operações de combate nas regiões de REVIA, RIO NECOLEZE, MUOCO, MECULA, NIPEPE e em algumas fazendas, tendo sofrido mais um morto o soldado CARLOS ALBERTO (o LAMEGO), que tombou em combate em NECOLEZE no dia 5 de Abril de 1966.
Em 10 de Outubro de 1966 a CART 637 regressa finalmente à Metrópole, depois de 2 anos, 5meses e 14 dias passados em zonas de combate, deixando em cemitérios de Moçambique (VILA CABRAL e MISSÃO de MAÚA) quatro dos seus militares mortos em combate, naquela guerra que não quiseram mas a que não se furtaram.
A CART 637 muito apropriadamente, adoptou uma divisa do seu distintivo: OS PRIMEIROS NA GUERRA DO NIASSA pois, juntamente com outras unidades, enfrentou os primeiros ataques inimigos em território de Moçambique.
A PÁTRIA HONRARAM QUE AS PÁTRIA OS CONTEMPLE

A 14 de Junho de 1965, morreu em combate um militar da CART. 637

COMPANHIA DE CAÇADORES 695


Comandada pelo Capitão de Infantaria, António Jacques F. Castelo Branco Ferreira, desembarcou em Moçambique em 2 de Agosto de 1964.
Em Outubro de 1965, foi transferida para Nova Coimbra, onde rendeu a CCAV 568. Sob o comando operacional do BCAÇ 598, que assumira em Setembro de 1965 a responsabilidade de novo subsector com sede em Metangula, desenvolveu intensa actividade operacional, resultando a destruição de muitos acampamentos, apreensão de material de guerra e documentos e reparação de milhares de elementos da população, que se encontrava refugiada nas matas. Participou em várias operações, nomeadamente: "Falas Mansas", e "Açor" (Messumba" e "Morcego" ( Namatumba).
Foi rendida pela CCAV 1506 em Fevereiro de 1966, montou base em Muembe no Niassa.
Regressou a Portugal em 6 de Dezembro de 1966.
E 
COMPANHIA DE CAVALARIA 754 

 "SETE de ESPADAS"

 Por: José Carlos Sousa Jorge
  furriel Miliciano da CCAV 754



A CCAV 754, comandada pelo Capitão de Cavalaria José Pedro Simões Caçorino Dias 
embarcou em Lisboa com destino a Moçambique, a 5 de Janeiro de 1965 e chegou a VILA CABRAL a 28 do mesmo mês, onde foi integrada no BCAÇ 598. A "SETE DE ESPADAS", percorreu praticamente todo o NIASSA Ocidental designadamente: NOVA COIMBRA- LUNHO- MADAMBÚZI- MIANDICA- CÓBUÉ- SONJA e LIPOTXE.
Pescaria no Rio Lunho
Após o acidente de guerra que o Capitão Caçorino Dias foi vítima, tornando-o invisual, esta Companhia teve os seguintes comandantes: Capitão de Infantaria Raul Pereira da Cruz Silva e pelos Capitães de Cavalaria Mário António Pádua Valente e Oscar da Rocha Lima.

Balanço Operacional

À entrada do LUNHO a caminho do nosso acampamento em NOVA COIMBRA, faltavam duas horas para terminar mais uma operação de quatro dias. Quando a Companhia vinha em marcha apeada soa um grande rebentamento. Sabendo-se de antemão que um de nós tinha pisado uma mina. Infelizmente, assim tinha sido o nosso querido camarada "ROCHINHA" tinha pisado uma mina.
Saber que não escaparia com vida e mostrar uma coragem que só está ao alcance de grandes homens, marcou-nos com o seu exemplo e serviu-nos para enfrentarmos as dificuldades das vicissitudes da guerra que tínhamos de travar.

"ROCHITA" FICASTE PARA SEMPRE NO NOSSO CORAÇÃO.
No lado esqº, o malogrado "Rochita, ao centro o Fur. Jorge
Estávamos acampados em NOVA COIMBRA (era o primeiro acampamento naquele local) junto ao Rio LUNHO, quando por volta das 22H chegou o Major Fradinho da Costa da CCS do BCAÇ 598, vinda de METANGULA dizendo que precisava de um Pelotão da nossa Companhia para ir ao encontro de uns rebentamentos ouvidos junto à Picada do Caracol (Picada METANGULA- MANIAMBA). De imediato saiu o nosso 3º Pelotão, comandado pelo nosso Cap. Caçorino Dias. Ao percorrerem cerca de 3 Kms caímos numa emboscada. Emboscada essa que estava preparada para nós, pois eles sabiam que a "SETE DE ESPADAS" não virava a cara a nada. Houve reacção forte da nossa parte. Estando debaixo de fogo o Cap. Caçorino Dias, chama o Ten. Carvalho Araújo que estava junto dele. Este ao fazer o deslocamento para junto do Capitão, fragmentou  uma mina anti-pessoal, ferindo na cara o Capitão que estava muito prto da mina, ferindo-lhe a cara e os olhos. O Capitão disse logo que tinha perdido a visão. Após o cessar-fogo, foi colocado no jeep do Major e, com este ao volante, seguiu de imediato para a nossa base que, como disse, estava a cerca de 3 Kms. Chegando à base pediu de imediato uma secção para o levar para METANGULA (Base dos Fuzileiros). 
Saiu  de seguida um Unimog com um condutor e um Furriel para abrir caminho até METANGULA. Chegando à base dos Fuzileiros foi logo observado pelo corpo clínico , confirmando que efectivamente era nos olhos que estavam os ferimentos.
Havia necessidade de fazer uma evacuação rápida para VILA CABRAL. Tentou-se comunicar via rádio, mas foi impossível.

De costas o Gen. Caeiro Carrasco a seu lado o 
Capitão Caçorino Dias no Lago Niassa
Como era urgente a evacuação do Cap. Caçorino Dias e não havendo tropa para ir a NOVA COIMBRA a informar da necessidade de um pelotão, o regresso a NOVA COIMBRA foi feita pelo mesmo condutor e Furriel que tinham acompanhado o Capitão Caçorino Dias à base dos Fuzileiros.
Quando da chegada NOVA COIMBRA já o 3º Pelotão que tinha sofrido a emboscada lá se encontrava, ficando a Companhia ao corrente do estado do Capitão. E da necessidade de fazer a evacuação de METANGULA para VILA CABRAL. Ficaram também a saber que o Tenente Carvalho Araújo não tinha ido para METANGULA pois só tinha ido o jeep com o Major Fradinho da Costa  no Unimog com o condutor e o Furriel, os mesmos que tiveram de fazer o regresso a NOVA COIMBRA. Ficou logo no ar que quem tinha pisado a mina tinha sido o Tenente Carvalho Araújo, tendo morrido de imediato.
O célebre Joaquim Agostinho, o 2º à dirtª a transportar
mais um soldado morto na zona do Lunho
 Saindo um Pelotão para tentar encontrar o Tenente que estava no local onde pisou a mina, o que não tinha sido apercebido a sua falta porque o capim estva alto e só a sua ausência em NOVA COIMBRA levou-nos à sua procura tendo sido confirmada a sua morte.
Este relato  do ferimento do Capitão Caçorino Dias é uma justa homenagem de todo o pessoal da CCAV 754 (7 de ESPADAS). Foi uma honra para nós semos comandados por este militar que consideramos um herói. Adicional à sua bravura e valentia era um condutor de homns fora do normal pois sempre contou com a Companhia incondicionalmente para todas as operações que eram solicitadas. Tivemos derivada às circunstância da nossa operacionalidade, quatro Comandantes, mas o espírito firme que a Companhia teve isso só com trabalho de comando que sempre foi mostrado pelo nosso Capitão, desde a formatura da Companhia, em SANTA MARGARIDA, até ao dia do seu ferimento, tendo ficado bem vincado o seu carisma de militar e humano até aos dias de hoje. Todos nós nos sentimoshonrados e orgulhosos por termos sido comandados por ele. 
Armamento capturado à Frelimo em Nova Coimbra
No balanço operacional a Companhia teve 6 mortos, 5 feridos evacuados e cerca de 30 ferios ligeiros. Em Maio de 1966, fomos rendidos pela CCAV 1506  e fomos para INHAMINGA de onde partimos de regresso a casa em Julho de 1967.

A 31 de Maio de 1965, morreu em combate quatro militares da CCAV. 754
2º Sargento QP  Joaquim Fernando
Soldado Manuel Henriques Monteiro
Soldado Manuel F. Parentes de Bouças
Manuel Luís Prazeres Lima
A 03  de Setembro de 1965, morreu em combate o soldado da CCAV. 754
José Fernandes da Rocha.

COMPANHIA DE CAVALARIA 1506



A CCAV. 1506, comandada pelo Capitão de Cavalaria Leopoldo Alberto Faro Pereira Pinto e integrada no BCAV 1879, embarcou, a 12 de Fevereiro de 1966.
Desembarcou em Nacala e foi Nova Coimbra, onde rendeu a CCAÇ 695.
De Fevereiro de 1966 a Março de 1967, efectuou patrulhamentos, nomadizações, emboscadas e abertura de itenerários. Participou nas operações "Dragão" (Namatumba) , "Estribo" (entre os rios Mepotxe, Trulo e Lucambo)"Lança em Riste" (Planalto de Miandica), "Gamarra" e "Quorum".
Em Março de 1967 é rendida pela CCAÇ 1558 do BCAÇ 1891.

A 15 de Fevereiro de 1967, morreu em combate um militar da CCAV. 1506
A 08 de Agosto de 1966, morreu em combate um militar da CCAV. 1506


domingo, 12 de novembro de 2017

Como eu vivi o 7 de Setembro de 1974 em Lourenço Marques Por: António Manuel Gomes Lopes (Pintinhas)

Eu sou o António Manuel Gomes Lopes, nascido a 10 de Junho de 1948 na linda Cidade de Lourenço Marques, no mítico Hospital Miguel Bombarda.
Vivi até aos 12 anos no carismático, bairro da Malhangalene. Mais tarde, vou viver para o bairro clandestino do Aeroporto paredes meias com a cidade do caniço. Daí a minha aproximação aos pretos de Moçambique, que sempre estimei e fui retribuído.
Em 1958 os meus pais vieram de licença graciosa para Portugal, Figueira de Castelo Rodrigo, na Beira Alta, onde tomo conhecimento do que era Portugal desses tempos. Um exemplo que jamais esquecerei era o do "Barbas", colega de turma, que no inverno ia descalço e o Toninho Cigano apresentava umas botas que fazia inveja a um rei.
Fiz por cá a 4ª classe e a admissão aos Liceus. Regressei a Lourenço Marques e vou para o Ciclo Preparatório na época a funcionar na Escola Industrial Mouzinho de Albuquerque. É aqui que nasce a minha alcunha de "Pintinhas", pela qual ainda hoje sou conhecido. Foi-me "dada" pelo professor de português, Pinto Martins, pessoa muito conhecida no âmbito escolar.
Ingresso na Escola Comercial  Drº Azevedo e Silva, na qual tiro o Curso Geral de Comércio. Finalizado o Curso, vou trabalhar nos escritórios da Cooperativa de Criadores de Gado.
Passei como bom COCA-COLA uma infância normal e feliz.

Em 1969, vou cumprir o serviço militar obrigatório. Faço a recruta em Boane. Este Centro de Instrução era o local de incorporação dos mancebos da Província de Moçambique. Frequentei o Curso de Sargentos Milicianos (CSM).
Nesse ano começaram a ser formadas companhias de Comandos de Moçambicanos em Montepuez, e os Grupos Especiais (GE). Ambos na época só para voluntários.
Decidi pelos GE por uma questão simples. O Alferes e o Furriel que vieram a Boane recrutar pessoal para os GE tinham sido meus colegas na Escola Comercial.
Quando acabámos o Curso de GE já sabia que tinha como destino a Companhia de Caçadores de Mocímboa da Praia.
Fiz algumas operações com esta companhia enquadrada com os GE de Palma, até que sou chamado a formar o Grupo de Nangade, o 205.
Sou graduado em Alferes e durante 26 meses fui conhecido pelo Alferes Pintinhass.
Em Agosto de 1972, termino a minha comissão em Cabo Delgado.


Alferes "Pintinhas"
A convite do general Kaúlza de Arriaga, fiz como capitão, um contrato de dois anos e, fui para o conhecido "TRIÂNGULO BRANCO"; Portugal, Moçambique e Rodésia do Sul. 
Eram comandados por mim na vila rodesiana de Kayemba, 2 alferes e quatro praças moçambicanos todos de raça negra. A nós juntaram-se 23 rodesianos. 
As reuniões de planeamento operacional eram efectuadas na cidade de Tete ou em Kyembe.
A 28 de Abril de 1974, a cooperação terminou, mas no entanto o grupo português ainda ficou por lá  até Junho desse ano. Neste mês regresso a  Lourenço Marques, à espera do que fariam da minha carreira militar.
Precisamente nessa época, sou convidado por dois portugueses radicados à longos anos em Lourenço Marques. Foram eles o Dr. Velez Grilo, que tinha sido meu médico pediatra e o Trajano da Mata, ambos muito amigos do meu pai. Foi a pedido deles que o meu pai me contactou para ter uma reunião com estes altos dirigentes de um partido, mais tarde vim a saber que era o FICO.
A primeira reunião, foi efectuada no restaurante do Aeroporto de LM, era um local que eu bem conhecia. Em caso de algo correr mal, eu estava em casa, pois vivi nove anos no bairro clandestino do Aeroporto. Paredes meias com a cidade do caniço. Por ter lá vivido convivi e fiz muitos amigos pretos e falo o seu dialecto.
A primeira reunião foi para os ouvir e ter a certeza, que o objectivo se coadunava com os meus princípio, mais ainda eu não poderia interferir directamente no assunto, pois ainda era militar.
Sucederam-se reuniões e numa esteve presente o sr. Rodolf  Botha que era da CID, (Centro de Inteligência e Defesa), sul-africana, que mais tarde me abriu as portas da África do Sul.
Havia uma sintonia perfeita para a construção em Moçambique de uma sociedade multirracial que a FRELIMO, Samora Machel que, assim não entendia. Houve uma tentativa de acordo antes da assinatura dos Acordos de Lusaka de encetarmos uma conversação com a própria FRELIMO através de um amigo de infância e de estudos que passarei a tratá-lo por "M".
Na época já se sabia quem era ou não pró FRELIMO e este meu  amigo que ainda o considero, apoiava a FRELIMO, mas não o radicalismo.
Três semanas depois, através dele tivemos como resposta um contundente, NÃO!
Sentimos-nos de mãos atadas e tomei a liberdade de falar com adidos militares de quatro países, que partilhavam as nossas ideias.. Mas, mesmo esses nada puderam prometer e muito menos fazer.
Gostaria que ficasse bem explicito que nas nossas conversas nunca se pediu armamento ou apoio militarizado. Queríamos apenas consensos. Eu e muitos outros moçambicanos brancos já íamos na terceira e quarta geração.


Alf. Alberto Chissano  e ALf. Toni Pintinhas
No entretanto acendeu-se uma luz ao fundo do túnel, o adido militar norte-americano, disse-nos para termos calma pois algo estava para acontecer que poderia levar a um entendimento.
As conversações continuaram e já com partidos cujos líderes eram dissidentes da FRELIMO. Homens e mulheres bem conhecidos que tinham pertencido aos quadros da FRELIMO.
Tivemos uma reunião numa residência no Alto Maé, não sabíamos o que se estava a passar. Estávamos apavorados.
Esperávamos que por parte do Governo português, que não houvesse um lavar de mãos, um abandono, mas foi isso que aconteceu, com a assinatura do Acordo de Lusaka entre o governo português e a FRELIMO. 
As promessas feitas pelo PCP e por Mário Soares à FRELIMO foram cumpridas. Com o Acordo, Portugal entregou Moçambique à FRELIMO e abandonou a população branca, para eles colonos.
No dia 6 de Setembro de 1974, sou procurado pelo Trajano, em casa dos meus sogros que moravam muito perto das antenas da Matola, contando-me o que se estava a passar em LM. A nossa bandeira estava a ser estropiada e davam-se vivas à FRELIMO e com ameaças à população branca.
Combinámos, não enfrentar os arruaceiros, porque não queríamos-nos colocar à sua imagem.
O interessante, é que os que estropiavam a nossa bandeira pela avenida da República, eram pessoas de uma família muito conhecida em Lourenço Marques, pelos seus dotes desportivos e passados dois anos foram corridos pela FRELIMO e foram viver para Portugal, que tanto ofenderam.
Foi uma noite sem dormir, houve uma enorme explosão nos paióis da Forças Armadas no bairro de Benfica. Pensei o pior. O Trajano telefona-me para casa dos meus sogros. Tínhamos combinado na reunião anterior que iríamos mais o Ferreira para as antenas do RCM na Matola,
Depois de muitas escaramuças, o povo, a 7 de Setembro de 1974, toma posse do Rádio Clube de Moçambique, já lá estávamos nas antenas para proteger a emissão do RCM.


Edifício das antenas do RCM, na MATOLA
Chego ao edifício das antenas por volta das 11 h, já havia pessoas a tentar entrar para o cercado onde ficava  o edifício de controlo de emissão das várias estações do RCM.
Uma pequena reunião com o Trajano estabelecemos logo as prioridades. Eu fiquei com a segurança.
Fecharam-se os portões, contra a vontade do povo, mas tinha que haver disciplina. Só entrava quem o Trajano e o Ferreira desse autorização, visto que eu não conhecia muitos dos indivíduos que colaboravam na causa, Tínhamos quatro pessoas da nossa confiança, que geriam a entrada e saídas.
O Trajano telefona ao Manuel (locutor), para que este através dos microfones do RCM convocasse para a Matola todos os GE (Grupos Especiais), pois o alferes "Pintinhas" os convocava.
Era uma manobra de diversão, os GE estavam no Norte.  Apareceram três ex-furriéis, , a primeira coisa  que me perguntaram foi: "armas", disse-lhes muito simplesmente que não havia armas porque não íamos fazer guerra.
Havia que vigiar as estradas  que davam acesso às antenas. Para as que vinham de Lourenço Marques ou de Boane, pela estrada velha da Matola, não foi difícil a vigilância, visto que havia um restaurante perto da passagem de nível, falei com o proprietário, para estar atento a qualquer passagem de viaturas militares com destino à Matola nos informasse por telefone.
A vigia na nova estrada da Matola também foi fácil. Um funcionário da SOVIM, que tinha aderido ao movimento, entrou em contacto com um colega para este os informar se havia movimentações militares na estrada.
A estrada que ligava a Matola a Boane era a mais problemática. Não conhecia ninguém nessa zona. Sendo assim um dos meus homens parte para Boane, fala com uns cantineiros e tudo fica resolvido. Assim, o perímetro das antenas  estava protegido e defendido. 
Só faltava sabermos o que de importante se passava no Quartel General. no Esquadrão, e no BCAÇ18. Tínhamos que  contactar com militares da incorporação moçambicana, entre os quais tínhamos muitos amigos. Para esse efeito, contactámos com alguns dos seus familiares e estes por sua vez pediram-lhes que se algo de anormal se passasse nas sua unidades que nos informassem.
Notícias vindas de LM, davam-nos conta que o RCM estava a abarrotar, o aeroporto tinha sido ocupado por ex-paraquedistas, da Cadeia da Machava tinham sido libertados os agentes da PIDE/DGS.
Estava convicto que até certo ponto tínhamos atingido o objectivo de tentar convencer o governo português que também éramos moçambicanos, não queríamos mais guerra, queríamos um Moçambique multiracial e unido. 
No dia 8, ao raiar do sol começam a aparecer boatos de todas as formas e feitios por exemplo: a vinda de armamento proveniente da África do Sul, para nos armar. eu sabia que isso era impossível,pois nas conversas havidas meses antes entre nós e o BOSS, ficou claro que eles jamais deixariam passar armas para Moçambique.
O 8 de Setembro foi um dia de muito diálogo, via telefone, entre Rádio Clube de Moçambique em Lourenço Marques e as antenas na Matola  do RCM, soube-se que a OPVDC, também se alia à causa. O comandante desta força, Tenente Coronel Vasconcellos Porto, era um pessoa sobejamente conhecida e de grande carácter. Privei com ele durante 2 anos em Nangade em Cabo Delgado.
Junto aos portões do edifício da antenas da Matola, era uma mole humana. As pessoas traziam comida, palavras de apreço e de confiança. Não sei porquê, o meu instinto de defesa em movimentações militares, dizia-me que íamos ter problemas, as chefias militares portuguesas já me tinham desiludido várias vezes.Sabendo eu que o MFA, apenas olhava para o seu "umbigo" e não queriam saber dos portugueses que nasceram, viveram e trabalhavam nas Províncias Ultramarinas.

Nangade 1971. General Kaúlza a passar revista aos novos GE,
acompanhado pelo Alferes "Pintinhas"
Recebemos um telefonema do restaurante da estrada velha da Matola, avisando-nos que uma viatura militar, com soldados armados de deslocava na nossa direcção, friamente pensei: quem quer que seja vou falar com eles.
Pedi ao povo para se afastar dos portões e que não molestassem oral e fisicamente os militares.
Esperámos por eles mais de uma hora e nada. Recebemos um novo telefonema do restaurante, dizendo que eles tinham voltado para trás. Mas tarde, soubemos que a cerca de um Km das antenas o oficial mandou a viatura de regresso a LM, tinha recebido a informação do condutor da viatura, que o RCM informava que os GE`s estavam tinham montado segurança às antenas.


Texto retirado do livro de Ribeiro Cardosos e já publicado neste Blog

"O capitão Gardete dizia que bastava cortar o cabo que alimentava as antenas, acrescentando que para as silenciar não era preciso deitá-las abaixo -- e lá se organizou uma coluna com meia dúzia de viaturas militares de transporte cheia de soldados negros com capacetes de aço e armados de G3. Chefiada por um capitão cujo nome não recordo, e integrando dois ou três oficiais, entre os quais o capitão Gardete e eu próprio que nunca me vira em tais preparos e apertos, lá chegámos à Matola, onde tínhamos à nossa espera centenas de brancos armados de caçadeiras, algumas de canos cerrados, apontados na nossa direcção.
O comandante da nossa coluna (Hoje Major-General das FAP, Ribeiro Cardoso) falou com o chefe da multidão de brancos que diziam que estavam a defender as antenas e que não obedeciam a nenhum militar. Assim, ala que se faz tarde, regressámos com o rabo entre as pernas ao  QG, como teria acontecido numa digna guerra de Solnado.
A explicação foi a de sempre: não fazer correr sangue. Para além, claro, de entre nós não haver um único atirador ou especialista em combate"...

Hoje continuo a pensar que teria sido uma chacina pois os militares que seguiam na viatura eram soldados pretos de 2ª sem preparação militar. No, meio da multidão havia pessoas com armas de pequeno calibre.

As horas iam passando, dramáticas, não sabíamos o que se passava e o que no esperava. Recebíamos alguma informação via telefone  do RCM em LM, ou de populares que chegavam à Matola e nos informavam dos acontecimentos junto ao RCM. Neste caso e  devido à minha experiência não podia acreditar em tudo. O boato é o pior dos inimigos.

O Começo do descalabro

Dia 9 de Setembro, já desgastados, a palavra dormir não existia no nosso vocabulário, o cérebro já não trabalhava na sua plenitude.
Cerca das 20 horas, alguém junto ao portão diz-nos que a tropa da Escola de Administração Militar de Boane (EAMB), vinha em direcção à Matola. Em 3 viaturas civis e fomos para a ponte da Matola. Para nosso espanto, a ponte tinha sido tomada por populares brancos, pretos e enfim de todas as raças, que apoiavam o nosso movimento. Percebi então, que as coisas iam dar para o torto. A noite estava fria e boa parte dos homens usavam gabardines, onde escondiam caçadeiras. Era difícil controlar, ainda pensei que estava a sonhar, mas não, era a verdade nua e crua.  Começo a ver a coluna militar e aquela multidão, enfrenta a coluna militar.
Alguém fala com o comandante e entre gritos e sei lá que mais. O comandante teve a consciência do que poderia advir, ou consultou via rádio os seu superiores e deu ordem de regresso a Boane,

Este texto foi extraído do LIVRO DE RIBEIRO CARDOSO:"FIM DO IMPÉRIO: 7 DE SETEMBRO DE 1974. MEMÓRIA DE UM SOLDADO PORTUGUÊS". DO 7 DE SETEMBRO AO 21 DE OUTUBRO, 45 DIAS ALUCINANTES Clika aqui para leres o livro

(...)O capitão Gardete dizia que bastava cortar o cabo que alimentava as antenas, acrescentando que para as silenciar não era preciso deitá-las abaixo -- e lá se organizou uma coluna com meia dúzia de viaturas militares de transporte cheia de soldados negros com capacetes de aço e armados de G3. Chefiada por um capitão cujo nome não recordo, e integrando dois ou três oficiais, entre os quais o capitão Gardete e eu próprio que nunca me vira em tais preparos e apertos, lá chegámos à Matola, onde tínhamos à nossa espera centenas de brancos armados de caçadeiras, algumas de canos cerrados, apontados na nossa direcção.
O comandante da nossa coluna falou com o chefe da multidão de brancos que diziam que estavam a defender as antenas e que não obedeciam a nenhum militar. Assim, ala que se faz tarde, regressámos com o rabo entre as pernas ao  QG, como teria acontecido numa digna guerra de Solnado.
A explicação foi a de sempre: não fazer correr sangue. Para além, claro, de entre nós não haver um único atirador ou especialista em combate...(...)

Já amanhecia quando voltámos ao parque das antenas, onde nos esperavam outras notícia. O movimento começava a radicalizar-se. Pede-se com veemência "ARMAS", Estava a enveredar por um caminho pelo qual eu temia.
O comando no RCM em LM, ordenou-nos que fossemos ao Lingamo, perto do porto de mercadorias, onde havia um armazém com armamento do exército português, que tinha chegado antes do 25 de Abril.
Duas viaturas com sete homens, com experiência de guerra e uma mulher, que nunca mais a vi e não tive oportunidade de lhe dizer: GRANDE MULHER, e nem sei se era amiga de alguém que integrava aquele grupo.
Chegados ao Lingamo, procurámos em vários armazéns o armamento, mas em vão, nada encontrámos.
Dirigimos-nos para o RCM, no trajecto não vimos viva alma, uma calmaria absoluta, o que para mim era um mau presságio. 
Chegados ao RCM estávamos informados para entrarmos pelas traseiras do mesmo pois a aglomeração de populares em frente ao edifício do RCM não nos permitia chegar às portas.
À porta, um homem com cerca de 50 anos, entrega à nossa companheira de aventura, uma esferográfica de metal, daquelas de quatro cores, que estava transformada  em arma de tiro. Jamais me esquecerei deste gesto. Entrámos e surpresa total, era uma desorganização completa, toda a gente dava ordens, ninguém se entendia.
A reunião entre os nossos representantes e os do governo português foi um rotundo fracasso,. Havia que ter a cabeça fresca e não fazer disparates. Encontro o Daniel Roxo que o conhecia desde as reuniões em Tete. Um abraço sentido e uma troca de palavras ao ouvido. "Isto foi um fracasso", vamos dispersar. Eu e os meus três companheiros de "luta", fomos para o carro e um deles desafia-nos para passar pela Mafalala, visto que tínhamos ouvidoque "ELES" se estavam a organizar. 
Foi assim que os três combinámos que entraríamos na Mafalala pela Caldas Xavier e o condutor esperaria por nós junto à Praça de touros.
Atravessámos a cidade do caniço e não houve hostilidades, como estávamos perto fizemos outro périplo, fomos ao bairro do Aeroporto aonde viviam os meus pais e onde cresci. Chegados ao Bairro junto ao Clube, estavam alguns residente e entre eles o meu pai. Estava tudo calmo mas, havia apreensão. O meu pai chamou-me à parte e disse-me: O Malangatana veio cá a casa para te avisar que eles estão a organizar-se. Respirei fundo, contei aos meus companheiros o que o meu pai me disse e decidi pedir-lhes para irem comigo até à Vulcano, onde morava o meu amigo "M", companheiro de infância e de estudos. Entre o Bairro do Aeroporto e a Vulcano, junto à linha  de caminhos de ferro já pressentimos alguma insegurança, os negros olhavam-nos ameaçadoramente, não por nos conhecerem mas sim por sermos brancos.
Bati à porta do "M", veio logo e mandou-no entrar, ficando apenas o dono do carro junto a este. Então, o "M", detalhadamente avisou-nos que "Eles" estavam a organizar-se com a anuência do Governo português, seria melhor, para não haver sangue, retirarmos-nos ou então deixar Moçambique. Ele foi muito contundente: "Pintinhas" vocês perderam, como amigo quero-te vivo, mas foge.
Abraçamos-nos, agradeci e voltamos para a Matola. Ao chegarmos às antenas, já não havia por ali população, o Trajano disse-nos: que apenas esperara por nós, para abandonarmos. De lágrimas nos olhos, percorri os 2Kms que distavam das antenas à casa do meu sogro. O meu castelo desmoronava-se, mas não dei parte de fraco.
Ao chegar junto dos meus familiares, vi que estavam todos apreensivos, tinham notícias dos ataques à população branca na área. Decidimos ir todos para a minha casa em Lourenço Marques, perto da casa mortuária do Hospital Miguel Bombarda.
Em casa fiquei como prisioneiro, os meus familiares tinham medo que eu cometesse alguma loucura. Não ouvia rádio, e não podia contactar os meus pais, pois não havia telefone
                    A FUGA

Dormi há 24 horas, quando a minha  me veio chamar para me dizer que o meu pai estava na nossa casa e queria com urgência falar comigo. Fui para debaixo do chuveiro, deixei a água cair para relaxar, pois a vinda do meu pai não agoirava nada de bom. Vesti-me, jamais o esqueço, uns calções e uma camisa grená que eu adorava.
Cumprimentos de circunstância, eu ainda vivia um sonho, o meu pai dá uma desculpa à minha mulher e aos meus sogros, dizendo-lhes que o meu tio e padrinho estava doente e que eu devia ie vê-lo. Vi logo que havia problemas, os meus pais moravam no Aeroporto e, para ele ali estar é que algo de grave se passava. Tentei disfarçar o mais possível, dei um beijo a cada um, peguei no meu filho que tinha 11 meses, dei-lhe um aconchego muito grande, pô-lo no colo da mãe, afaguei-lhe a cabeça e saí de casa sem olhar para trás. A minha sogra, com a perspicácia que lhe era reconhecida, vira-se para a filha e diz: "o teu marido vai fugir", a minha mulher responde: que isso era impossível..
Instalados no carro do meu pai, iniciámos uma viagem sem regresso e sem eu saber para onde.
No trajecto, meu pai, conta-me que a Av. de Angola, estava a ferro e forro, que passara uma coluna supervisionada pela tropa. Um magote de ditos apoiantes da FRELIMO tinham atacado a esposa do sr. Mota que era camionista e vivia no Bairro do aeroporto, tendo-a violado, vindo-se a saber posteriormente que a senhora ficara paraplégica

Lourenço Marques, 10 de Setembro de 1974. O FIM. A debandadada
Continuámos a viagem e ao passarmos pela brigada de Trânsito, junto à missão de S. José, parou o carro e disse-me: Os gaijos andam à tua procura. Foram a minha casa e eu disse-lhes que não sabia onde estavas, queriam a tua morada e eu dei-lhes a da anterior casa, em frente ao Hospital Miguel Bombarda. Alguém nos telefonou para te avisar que tinhas que fugir, alguém te irá recolher perto das antenas da Matola (ironia do destino), era a mesma para paragem onde eu descia ou apanhava o machibombo quando ia namorar aa minha mulher.
Ao chegarmos ao local, o meu pai disse-me: é um VW que te vem buscar, quando chegares ao outro lado da fronteira, os sul-africanos deixam-te telefonar para minha casa, para instruíres como é que a tua mulher e o teu filho iam ter contigo (a minha mulher estava grávida de 3 meses). Esperei cerca de meia hora, a mais longa da minha vida, finalmente aparece o dito VW, com quatro pessoas que eu não conhecia de lado nenhum. Mandaram-me entrar e sentei-me no banco traseiro, no meio de dois indivíduos um pouco mais velhos que eu. Calados, seguimos em direcção a Ressano Garcia. Ao chegarmos a Boane, havia uma fila de automóveis, esperei pelo pior, visto que os militares estavam a revistar os carros e quando chegou a nossa vez, um alferes perguntou ao nosso condutor para onde íamos, não ouvi a resposta visto que para me disfarçar fingi que estava a assoar e olhava em volta, os militares eram pretos, com camuflados novos, o que queria dizer eram recrutas. O alferes mandou-me tirar as mãos da cara, olhou para mim, reconheceu-me. Tínhamos estudado na Escola Comercial,  embora sendo mais novo o que eu. Disse: Siga...sigam. Aliviados, fomos até Ressano Garcia, apenas se ouvia o motor do VW, Quatro a cinco Kms antes antes da fronteira o condutor parou o carro e disse: entrem no mato, percorram cerca de 1 Km que alguém estará à vossa espera. Não houve despedidas, calados, seguimos as instruções, nem tínhamos andado 10 minutos, apareceram dois homens, um português e um sul-africano, disseram-nos para os seguir e passámos um arame farpado, fomos entregues à polícia sul-africana. Fui conduzido a um jeep, os outros ficaram com a polícia. Nunca soube quem eram os meus companheiros de fuga. Aproveito para lhes dar um abraço.
Metido no jeep, perguntaram-se se eu era o António Manuel Gomes Lopes  "Pintinhas", disse que sim mas não tinha documentos, responderam que não era importante.
Fui com eles até ao campo de refugiados de Komatiport, que ocupava um campo de Rugby. Levaram-me para um escritório improvisado e aí percebi que eles eram da CID (Polícia de Defesa Sul-Africana) e que já tinham o meu perfil.
Pediram-me apenas, para ser tradutor em alguns casos ao qual eu anuí tendo-lhes perguntado qual a situação da minha mulher e do meu filho, tendo respondido: estamos a tratar disso.
Eram quase 8 horas da noite.

CHEGADA e ESTADIA NA ÁFRICA DO SUL

À chegada ao acampamento, entregaram-me um colchão, uma manta, umas calças e uma camisa. As pessoas iam-se acomodando como podiam debaixo das bancadas, tentando dormir ou descansar. Eu, ia mudando de sítio, queria ficar só e pensar no que tinha feito e o que me iria acontecer. Pensava na minha mulher e no meu filho, o que será deles. Essa noite, passei-a a revisitar os últimos acontecimentos da minha vida.

Estudantes Universitários de Lourenço Marque, 1974. 

Fiquei parvo com o que ouvia, muitos universitários, tinham aderido à FRELIMO, não sei se por medo se por conveniência. Muitos jovens da minha idade e meus amigos fizeram o mesmo. Houve quem relatasse que a morgue do Hospital estava pejada de cadáveres, muitos eram brancos e alguns tinham graxa preta no rosto.
Foi desolador e preocupante ouvir aqueles relatos, a minha família estava em LM e, eu não sabia nada deles. Tomei por verdade o que ouvia mas, coloquei algumas reticências. Mais tarde a polícia sul-africana tudo me confirmou.
No dia seguinte dirigi-me ao Oficial da Polícia, já não do dia anterior. Apresentei-me e com muita simpatia informou-me que "vamos tratar do seu assunto". Sabemos que tem família na África do Sul, respondi que sim mas, bem longe em Bloenfontein. Tem aqui o telefone ligue para a sua família para encontrarmos a via mais fácil de a sua mulher e seu filho se reunirem consigo. Telefonei ao meu pai, este como sempre, queria-nos era a salvo e bem. Como era muito perigoso não poderia ir à Matola dar o meu recado aos meus sogros. Fiquei de telefonar novamente para vermos o que de melhor poderíamos fazer.  O novo contacto foi para o meu sogro e este prontificou-se a levar a filha e o neto à fronteira de Ressano Garcia . Apenas tinha que saber aonde os deixar pois não possuíam passaporte. Expliquei tudo à Pilícia Sul-Africana  e de imediato estes delinearam um plano. Enviaram alguém com o nome de código"OSCAR" , todo vestido de azul e ficava à espera a cerca de 2 Kms da fronteira. Sabendo que era o meu sogro que os transportava, comuniquei à polícia que os meus familiares vinham num Ford Escort vermelho com uma determinada matrícula.
Foram horas de desespero, cerca das 3 da tarde, foi-me dito que deveria ir ao portão central, pois alguém queria falar comigo. Foi um momento de tensão que jamais esquecerei visto que não imaginava o que iria encontrar. Levei algum tempo a fazer o percurso, várias pessoas acercavam-se de mim e perguntavam-me o que é que lhes ia acontecer, o que tinham que fazer. Fui-lhes dizendo que as autoridades sul-africanas não nos iriam abandonar, para acreditarem neles, visto que eles nos ajudariam em tudo o que nós precisássemos.

Chegado ao portão perguntei ao polícia por quem me procurava, apontaram para um homem, era um conterrâneo dos meus pais que tinha sido contratado pelos meus familiares de Bloenfontein que estava pronto para me ajudar a sair daquele campo. Ficámos em conversa pondo-me ele ao corrente do que se estava a passar em Moçambique.A conversa prosseguia e por volta da 5 da tarde, vejo um jeep a cruzar o portão com várias pessoas, olho com curiosidade, e vejo a minha mulher e o meu filho. Foi uma comoção inexplicável. Tínhamos que sair dali foi o meu primeiro pensamento. Falei com o conterrâneo dos meus pais se ele podia assinar a papelada e ficasse responsável pela minha saída, pedido que de imediato aceitou. Não queria que os meus familiares vissem a angústia das pessoas que estavam no Campo de Refugiados.
Os quatro, dirigimos-nos ao improvisado escritório do oficial da polícia sul-africana, contei-lhe os meus propósitos e rapidamente assinou os papéis para sairmos do campo (nós não tínhamos qualquer documento). Deram-nos um "PERMIT" temporário, de 3 meses, o nosso amigo levou-nos à estação de comboios de Komartipor, pagou-nos os bilhetes até Bloemfontein. Foram cerca de 24 horas de viagem, não queria pensar mais no que tinha deixado para trás, ia para longe, fora do rebuliço de Johnnesburg que me seria desfavorável. Ficou para trás uma carreira militar, uma deserção, mas bem longe de governos VERMELHOS.
Fui bem aceite pela pequena comunidade portuguesa de Bloenfontein, o patriarca dessa comunidade o já falecido sr. Avelino, foi um homem chave na minha adaptação, à minha nova vida. O meu familiar, arranjou-me de imediato emprego, era algo que eu nunca tinha feito ou estudado. Trabalhava em ar condicionados, agarrei-me de alma e coração, trabalhei e estudei muito mas venci. Apenas um problema, estive três anos sem documentos. A minha mulher, e o outro meu filho, já nascido na África do Sul, já estavam completamente legalizados. A mimo consulado português, levou três anos a dar-me o B.I, a minha sorte é que a polícia de Segurança sul africana (CID), sabia muito bem da minha situação e foi-me dando periodicamente, autorização de residência.
Custaram-me muito estes três anos, não podia fazer planos futuros. Quando o consulado me entregou o B.I  e já com a residência permanente, a empresa para a qual trabalhava transferiu-me para Johannesburg. Uma nova etapa na minha vida.
Jamais esquecerei a ajuda que a CID, me prestou em todos os aspectos. No nascimento do meu segundo filho, fomos apoiados a nível de saúde e sem termos de pagar um cêntimo..

CHEGADA A JOHANNESBURG

Finalmente em Johannesburg, outra vida social. Grande parte dos meus amigos de Lourenço Marques, já lá estavam a viver. A comunidade portuguesa na cidade,  era enorme e estava bem organizada. Respirava-se melhor. Voltei a sorrir, esqueci grande parte das minhas angustias relacionadas com o 7 de Setembro. Já pouco se falava no assunto, comecei a ir ver jogos de Hockey, futebol, Basquete e até havia o Malhanga. Estava em casa.
Não queria terminar este depoimento, sem divulgar algo que ainda hoje para mim é um mistério.
Em 1984, encontro ocasionalmente, o Trajano da Mata, que alegria, ambos pensávamos que o pior tinha acontecido às nossas vidas.
Todas as 3ª no final da tarde, frequentava um café onde comprava o jornal Português editado na capital do Rand, mais o jornal ABola, visto que ficava a caminho de casa. O dono do café era natural da Beira e aproveitava para conversar um pouco antes de regressar a casa.
É numa dessas terças-feira que encontro o Trajano, que também era cliente assíduo desse café. Foi o primeiro encontro de muitos que fazemos questão de ter durante muito tempo. Interessante nunca falamos do passado, o passado ficou enterrado, conversávamos sobre a política portuguesa, da sul-africana, por vezes o Beirense entre as nossas conversas e o atendimento de um cliente, dava o seu palpite. O café ficava próximo de uma mina e como tal havia muitos pretos moçambicanos que se iam abastecer ao café que também vendia géneros alimentícios, excepto bebidas alcoólicas e seguiam as suas vidas.
Porém, certo dia um mineiro, aproximou-de nós e em bom português disse que gostaria de falar connosco, fora do café, olhámos para ele com curiosidade e anuímos.
De facto o homem era mineiro, encapotado, perguntou-nos se o podíamos ajudar, visto que o povo moçambicano estava a sofrer com a DITADURA de Samora Machel. Havia uma facção militar que não estava contente e que dentro de poucos dias chegaria a Johannesburg, um coronel, que necessitava de ajuda médica e queria entrar em contacto com o governo sul-africano. Ficámos parvos, nem queríamos acreditar no que estávamos a ouvir. Combinámos encontrarmo-nos no mesmo café dois dias depois. 
O Trajano continuava a ter ligações com Pretória e ficámos de conversar no dia seguinte. A minha adrenalina começa a mexer, tinha prometido à minha família que não me metia em mais complicações.
No dia seguinte, o Trajano diz-me que tinha um contacto em Pretória e que estava pronto a conversar com o Coronel moçambicano.
Informámos o "mineiro" e este ficou de nos avisar da data que o oficial da FRELIMO chegaria. E, assim foi. Ao cair da tarde desse dia, eu e Trajano, e o "mineiro", fomos para o Hotel onde o Coronel estava hospedado. Quando subimos ao seu quarto o oficial estava a trocar o seu camuflado por roupaà civil. Feitas as apresentações, seguimos de imediato para Pretória. aqui chegado fomos ao encontro de um sul-africano. Feitas as apresentações eu e o Trajano afastámos-nos, para os dois conversarem à vontade.
Nunca soubemos o que falaram e francamente nunca me interessou. De regresso a Johannesburg, deixámos o Coronel no seu Hotel e o "mineiro" perto do café.
Vim para Portugal em Agosto de 1986, em Outubro desse ano, Samora Machel, morre num "acidente" aéreo. Este "acidente" ainda hoje tem muitos contornos especulativos. Para mim, o "acidente" teve as "mãos" do tal Coronel e das autoridades sul-africanas. Sem provas em contrário, até a CIA (USA) tem essa precessão.
Foi o virar de página da História de Moçambique.


Fim